quarta-feira, 16 de março de 2011

O PROGRAMA DE PRODUÇÃO DE BIODIESEL EM QUIXERAMOBIM: POLÍTICA PÚBLICA DE EQUILÍBRIO ECOLÓGICO E INCLUSÃO SOCIAL

por Dennis de Oliveira Santos



Como a produção de biodiesel num município do interior brasileiro pode contribuir para o equilíbrio ecológico e a inclusão social de segmentos sociais empobrecidos do semi-árido nordestino? Analisar de que forma a produção de biodiesel, por exemplo, no interior cearense tem impactos sobre a redução da poluição atmosférica é de suma relevância para trazer respostas empíricas para esse tema. Em outros termos, qual a importância da fabricação de agroenérgia numa cidade como Quixeramobim para a diminuição do uso de petróleo e óleo diesel (geradores de gases poluentes) no setor automobilístico?

Compreender a potencialidade do programa de biodiesel na geração de emprego e renda para pequenos agricultores do semi-árido nordestino. Quer dizer, como essa política pública pode gerar a inclusão social de amplos segmentos empobrecidos do meio rural? É possível vislumbrar nesse programa de alternativa energética uma política descentralizada, na qual se valorize o envolvimento de atores sociais (sindicatos, associação de agricultores, movimentos sociais em geral) na implantação e decisões dessa política pública?

Nos últimos anos, o tema Aquecimento Global alcançou um lugar privilegiado nas reuniões e debates de dirigentes das grandes nações mundiais. Conseqüentemente, as discussões em torno de seus efeitos e possíveis soluções tornaram-se mais densas. Há um consenso, entre diversos cientistas, de que os efeitos da agressão ambiental provocada pelo homem vêm ameaçando a sobrevivência no planeta.
Envolta por uma camada cada vez mais espessa de dióxido de carbono (CO2) e de outros gases igualmente tóxicos, emitidos por fábricas, indústrias, automóveis e de outros agentes poluidores, a Terra vem passando por um fenômeno climático de larga extensão, que tem implicado no aumento da temperatura média terrestre nos últimos 150 anos.

Nesse sentido, analisar as políticas públicas empreendidas pelo Governo Federal Brasileiro, em conjunto com governos estaduais e setores da sociedade civil, possibilita uma relevante fonte de conhecimento acadêmico acerca dessa recente postura que vem surgindo por parte do Estado em relação ao desequilíbrio ecológico.
Desse modo, a busca de uma matriz energética “limpa”, não poluente, coloca o Brasil em vantagem por suas dimensões continentais e quantidade de terras agricultáveis. A partir dessa perspectiva, o Governo Federal lançou no ano de 2004, o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB). Essa política pública justifica-se pela crescente demanda por combustíveis de fontes renováveis e no potencial brasileiro para atender parte expressiva dessas necessidades, gerando emprego e renda na agricultura familiar e contribuindo para melhoria das condições ambientais no país (BRASIL, 03/11/2007).

Pelas suas condições de clima e solo, o país possui grande potencial de produção de biomassa. A agregação de valor à produção primária representa importante vantagem comparativa para o Brasil. Assim, o biodiesel é um promissor produto dentre essas possibilidades, pois a demanda de energia tende a aumentar diante da necessidade mundial de buscar novas fontes de energia que não agridam o meio ambiente.
Assim, o Governo vislumbrou a possibilidade de engajar agricultores familiares mais pobres do país na cadeia produtiva de biodiesel. Isso foi efetuado mediante estímulos tributários às empresas que adquirem a matéria prima (mamona, girassol, etc) produzidas por esses segmentos. Para levar essa estratégia governamental de agroenergia aos usuários de combustível, a mistura do biodiesel ao diesel de petróleo, em proporções crescentes nos próximos anos, foi tomada obrigatória por força de lei. Desse modo, o programa de biodiesel busca consolidar o equilíbrio ecológico junto à inserção social de camadas pobres no setor produtivo.

O Biodiesel é o biocombustível derivado de biomassa renovável (mamona, cana de açúcar, girassol, etc) para uso em motores a combustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para outro tipo de geração de energia, que possa contribuir parcial ou totalmente para diminuição do uso de combustíveis de origem fóssil (BRASIL, 03/11/2007). Esse programa deverá estar aderente à política ambiental brasileira e em perfeita integração com as disposições do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Quioto, aumentando a utilização de fontes renováveis, com menos emissão de gases de efeito estufa e contribuindo com a mitigação deste efeito por meio da diminuição do carbono. Além disso, essa política pública deve constituir-se em um vetor da interiorização de desenvolvimento, da inclusão social, da redução das disparidades regionais, em especial pela agregação de valor na cadeia produtiva do agronegócio (BRASIL, 07/11/2007).

Porém, para que esse programa tenha sucesso, o Governo Federal vem procurando estimular iniciativas que impulsionem a produção e o uso do biodiesel nas demais esferas governamentais (Estados e Municípios). Nesse sentido, a partir da parceria entre as três esferas públicas, no ano de 2006, o Ceará começou a cultivar mamona para produção industrial de biodiesel. O programa piloto foi iniciado no município de Quixeramobim, em uma área de 70 hectares, e que gera 60 empregos diretos. Atualmente são extraídos 350 litros de biodiesel por dia, mas estima-se que a partir do ano de 2008, serão 800 litros diários a partir da usina quixeramobense, que fica a 224 quilômetros da capital cearense (ESTADO DO CEARÁ, 07/11/2007).

Articulado a partir do Governo Federal, o programa envolve o governo estadual, a prefeitura do município e um consórcio de empresas termoelétricas. Até agora já foi investido R$ 1,5 milhão no cultivo da mamona. E para o ano de 2008, o governo estadual anunciou que pretende investir cerca de R$ 11 milhões para incentivar pequenos agricultores de mamona nas cidades de Crateús, Quixadá, Quixeramobim, Pedra Branca e Santa Quitéria.
Diante de toda a diretriz do programa e dos incentivos financeiros governamentais, observando o projeto piloto em Quixeramobim, lançam-se os seguintes questionamentos acerca do tema:
* Qual a importância da fabricação de agroenérgia em Quixeramobim para a diminuição do uso de petróleo e óleo diesel (geradores de gases poluentes) no setor automobilístico?
* Como essa política pública pode gerar a inclusão social de amplos segmentos empobrecidos do meio rural? É possível vislumbrar nesse programa de alternativa energética uma política descentralizada, na qual se valorize o envolvimento de atores sociais (sindicatos, associação de agricultores, movimentos sociais em geral) na implantação e decisões dessa política pública?

O questionamento ecológico é fomentado pela estratégia do uso de biodiesel pelo Governo Federal. Pois a adição de biomassa na gasolina tem o efeito de oxigenar o combustível e melhorar sua combustão, levando a redução dos gases emitidos. Nesse contexto, o Brasil é pioneiro no uso deste produto como combustível em veículos automotores: o país é o maior usuário mundial de biodiesel e o volume de consumo anual tem oscilado em torno de 12,0 bilhões de litros.
Assim, nos próximos oito anos, o programa de biodiesel tem a finalidade de reduzir drasticamente os gases poluentes oriundos dos combustíveis tradicionais, ao utilizar a agroenergia nos novos veículos existentes no mercado do tipo “combustível flexível” (BRASIL, 07/11/2007).

Já a questão acerca da inclusão social é alimentada pelo fato do grande potencial de geração de emprego e renda existente no semi-árido brasileiro. Estima-se que, no Nordeste, que com 6% de participação da agricultura familiar na produção de biodiesel haverá geração de 138.507 empregos no campo. A renda com esse tipo de atividade irá dobrar o rendimento econômico dos trabalhadores envolvidos no programa: de 97,00 reais, cada família passará a obter 333,13 reais por mês com a produção de agroenergia na região nordestina (BRASIL, 06/11/2007).

Além desses aspectos sociais, a política pública de biodiesel abre a possibilidade de que a população atendida possa ter a oportunidade de influir de modo decisório nas ações e intuitos desse programa. Pois desde a criação do projeto, setores organizados da sociedade civil como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), desempenharam um papel fundamental ao exigirem que o Governo Federal priorizasse nesse programa, ações que contemplassem a inclusão social de amplos segmentos empobrecidos do meio rural (BRASIL, 04/11/2007).

BIBLIOGRAFIA

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Max Weber e a Objetividade do Conhecimento na Ciência Social

por Dennis de Oliveira Santos



Weber, que defende a idéia de que os valores não soam como objeto de demonstração cientifica, desenvolve uma discussão em que intenta estabelecer a distinção entre juízo de valor e conhecimento cientifico. A escolha de valores ou de fins é tarefa do homem pratico, não é tarefa da ciência. Enquanto o homem de ação toma posições valorativas, a ciência ensina a esse individuo o conhecimento dos fins que ele procura em suas ações.

Além do conhecimento dos juízos de valor, a ciência pode ainda avaliá-los criticamente. Portanto, a ciência pode oferecer conhecimentos sobre juízos de valor, propiciando ao homem condições de avaliá-lo criticamente. Lembrando que os julgamentos de valor são subjetivos, incoerentes no oficio cientifico. Com isso, o cientista social divide com Kant a concepção de que a idéia do homem é cindida em dois mundos. O alcance do conhecimento exige do cientista uma adequação neutralidade axiológica, mas isso não é o suficiente para garantir a objetividade do conhecimento. Essa objetividade também exige a observação de procedimentos metodológicos.

O sociólogo alemão também desaprova o uso metodológico do materialismo histórico e do monis naturalista no interior das ciências da cultura. As generalidades conceituais provenientes desses métodos deixam de fora da analise as individualidades históricas que não podem ser subsumidos as leis gerais. Adiante, discute-se acerca da significação dos fenômenos sociais. O momento subjetivo na produção do conhecimento não tem nada a ver com os julgamentos de valor do pesquisador; o cientista social pode investigar valores sem glorificá-los ou condená-los. Neste caso, o momento subjetivo não tem nenhum papel a desempenhar na construção do conhecimento. A relação e a comprovação da verdade enunciada teoricamente são dois momentos distintos.

Por ultimo se discute sobre a realidade e método das ciências sociais. A resposta a esse assunto é esclarecida por Weber a partir da construção dos tipos ideais. O tipo ideal é um poderoso instrumento de investigação da realidade. Sua função é a de ordenar a realidade e torná-la acessível a pesquisa. Como instrumento de conhecimento, esse tipo ideal tem uma função puramente cognitiva e heurística.

Crescimento da Violência Urbana no Ano de 2004 nas Metrópoles Brasileiras

por Dennis de Oliveira Santos



A sociedade brasileira convive com altos índices de criminalidade urbana, instituindo um comportamento de insegurança e incapacidade dentre o seio da sociedade. Nas últimas décadas este índice elevou de forma grotesca, sendo incorporada pela mega corporação do crime organizado. No entanto, a raiz da violência não é apenas uma questão de segurança publica, mas sim, um fruto de diversos elementos.

De fato o crescimento desta violência está atrelado a uma serie de fatores sociológicos que o precede. Nota-se, por exemplo, que mais da metade da população brasileira que tem algum oficio ganha no máximo dois salários mínimos, gerando uma quantificação exorbitante de indivíduos que sobrevivem à margem da miséria.

A reprodução do capital é outro fator impar para o fortalecimento da criminalidade em nossas metrópoles. Associados aos recursos do Estado e setores industriais, poucos projetos de oportunidades de trabalho são gerados aos assalariados. Ainda se somam metas mínimas de nossos governantes com a ausência de qualificação de nossa população. Desencadeando uma serie de pessoas sem emprego, que nos pequenos delitos busca uma fonte de subsistência.

A acumulação de bens por uma pequena parcela constrói uma imensa pirâmide de desigualdade social. No topo desta, poucos usufruem um bem estar social. E a esmagadora maioria, ao pé desta pirâmide, está a mercê de toda a falta de fatores primordiais para sua estruturação social.

O nível educacional ao decorrer dos tempos contribuiu a desolação da nossa população. Com professores maus pagos e má formada, com uma defasagem de nosso sistema educacional, constitui um povo de frágil organização social. Que ao invés de criar sérios sindicatos que lutem por seus direitos, provoca inúmeros jovens prematuramente iniciados na marginalidade pela ausência de uma boa educação.

A ausência de totalidade do cumprimento das leis instituídas pelo Estado é outro fator bastante pendente na escala de fatores desta criminalidade. Por exemplo, está na constituição Brasileira, no Art. 5º que, "Todos são iguais perante a lei e garantindo-se aos Brasileiros e aos estrangeiros residentes no país o direto a vida, a liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.", onde esses direitos quase que sempre não são respeitados. É verdade que no nosso país a segurança que é atribuída à polícia de um modo geral, que ameaça a sociedade e a democracia num regime democrático, onde se prega os direitos humanos e a cidadania, mas na maioria das vezes, a violência policial viola todos esses fundamentos e não executa devidamente tais leis institucionalizadas. Outro exemplo se constata no Art. 5º Inciso III diz: "Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Porém, dentre os países da América Latina, o Brasil tem o maior índice de óbitos em ocasião da criminalidade, onde o descaso ao presente e ameaçador crime organizado do tráfico de drogas, entorpecentes e de armas são os resultados da desorganização do Estado.

Outro alarmante fator é a violência domestica, onde as principais vitimas são mulheres entre 30 e 35 anos. Onde indivíduos com problemas alcoólicos ou financeiros, sem o devido senso de educação civil violentam suas esposas. Somado tais fatores à falta de cumprimento das leis e a carência de boas estruturas de delegacias femininas, ocasiona em 90% de retirada de queixas feitas por estas vitimas.

A falta da conscientização popular e a ausência do cumprimento dos Direitos Humanos contribuem a este estado generalizado de criminalidade, onde a tarefa mais urgente não é a sua declaração, mas sim, o de seu cumprimento. Esta frustração gera casos como o modelo carcerário, onde não se reeduca e tão pouco ressocializa o individuo. Diagnosticando um instrumento ineficiente que serve apenas para estigmatizar a área da segurança. Outros exemplos como direitos a minorias escritos nos Direitos Humanos também não são cumpridos nos país.

Aliado a todo este contexto social, a ausência do combate ao crime organizado ao longo das décadas agrava tal situação. Décadas anteriores eram menos alarmantes, roubos e assassinatos não eram efetuados diante de uma densa organização criminal. O Estado não alocou grandes verbas para combater o problema, era uma questão "invisível" para eles. Agora, há o "emprego" multinacional da industria do pó. Imensas favelas dominadas pelo poder do trafico, milhares de aliciados a uma "milícia" criminosa de Fernando Beira Mar e outros.

Aparentemente estamos num centro insolúvel desta violência urbana, a mercê de uma burocracia policial de desorganização e corrupção. Atrelados a diversos atrasos de nossos poderes judiciais, que muitas vezes se rende à corrupção oferecido por facções criminosas como PCC e o CV.

Um meio açoitado pela carência de soluções governamentais, e uma tardia consciência social. Tentando solucionar a questão com planos ineficazes como: combate ao crime pelo exercito, desarmamento da população civil, etc. Tais projetos não vão a raiz da problemática, de onde surge uma população amedrontada, que ao máximo, realiza apenas passeatas pela paz e cidadania.

Os dados demonstram total conseqüência desta questão, onde mais de 336 mil adolescentes com idades entre 15 e 19 anos vivem em regiões de elevado risco de contagio pela violência. Um país onde a taxa nacional de vitimas entre jovens de 15 a 24 anos passou, em duas décadas, de 30% para 52% por grupos de 100 mil indivíduos estudados.

Constata-se que a violência urbana é um complexo fenômeno social decorrente de diversos elementos, onde o que menos importa são as leis e os seus cumprimentos. Onde a população é vitima de propagandas enganosas em planos de supostas fáceis soluções, que submergi numa situação ainda mais caótica. Assim, procedendo a fronteira da morte e criminalidade para nossos habitantes, que com a falta de projetos firmes e uma serie de fatores sociais, forma um poder criminal em suas cidades. Poder que gera uma imensa guerrilha urbana e uma bandidagem que perdeu o respeito pela policia e outras autoridades do Estado.

Aprendizagem: Processo Contínuo

por Dennis de Oliveira Santos



(Discurso proferido na colação de grau do referido autor na graduação em Ciências Sociais pela Universidade de Fortaleza em janeiro de 2008).


Excelentíssimo Senhor Chanceler Airton Queiroz,
Magnífico Reitor da Universidade de Fortaleza, Professor Carlos Alberto Batista Mendes,
Ilustríssima senhora Yolanda Queiroz, Vice-Presidente da Fundação Edson Queiroz,
Excelentíssimas autoridades presentes,
Ilustríssimos professoras e professores,
Senhoras e senhores,
Caros formandos,

A reta final de uma graduação nos conduz ao ponto de partida. Qual de nós não recorda o peculiar momento da admissão no vestibular após longos dias de estudos sob pressões incomensuráveis; dos constantes esforços na tentativa de apreender as noções de diversos saberes? Todos os graduados desta noite passaram pela constante necessidade de expansão da base do aprendizado, muito além das fronteiras dos livros e conhecimentos específicos das respectivas áreas. Enfim, podemos dizer que nos capacitamos para atuarmos em nossa profissão, embora conscientes de que a aprendizagem é um processo contínuo. É chegada a hora de cruzarmos os muros acadêmicos e depararmos com o mundo repleto de complexidades.

O que mais nos marcou nesta árdua jornada? Decerto que teremos respostas bastantes díspares. O fato é que cada pequeno momento, cada uma dessas distantes lembranças simboliza e representa algo em nossas vidas. Estamos rodeados por símbolos neste mundo hipertextual: as formalidades desta cerimônia, o formato deste auditório que nos cerca, as vestimentas que nos ocultam, a música que entoa em nossos ouvidos, o tapete vermelho que nos conduz e o título que, em breve, nos será conferido. Símbolos que despertam diferentes emoções e sensações em cada um de nós. Diferentes foram as motivações que, entrelaçadas, balizaram nosso caminho rumo à profissão que abraçamos. Resta dizer que a cerimônia solene de hoje é símbolo final e inicial, chegada e partida, semente e fruto. É hora de celebrar. Após vários esforços e muitas renúncias atingimos o alvo desejado, porquanto alcançamos o objetivo a que nos propomos: somos bacharéis no tipo de conhecimento específico com o qual mais nos identificamos. Este título é algo que deve ser comemorado com a mais profunda e sincera alegria por todos nós. É, portanto, mais do que justo que celebremos com toda ênfase este momento.

No entanto, de que serve o título que estamos prestes a receber se não tivermos consciência da nossa eterna condição de aprendizes, se olvidarmos a eterna certeza de nossas dúvidas, se não evitarmos a arrogância intelectual, se não tivermos o espírito humilde para a busca incessante por novos conhecimentos e se não compartilharmos o saber adquirido? Em qualquer formação acadêmica, quatro ou cinco anos de graduação universitária já não são suficientes para atender às necessidades do voraz mercado e da rígida divisão do trabalho social. É preciso mais!

Muito mais que cavaleiros em cerimônia de investidura, muito mais que fazer parte de parcela privilegiada da população brasileira que tem acesso à educação, mais do que possuidores de condições potenciais para galgar uma situação financeira confortável, nós somos responsáveis moralmente por atender aos clamores e deveres que derivam do referido título acadêmico. A função do conhecimento adquirido em todos esses anos de estudo é servir a nossa comunidade em suas necessidades. Afinal, para que servem os instrumentos que dominamos, as informações teóricas que adquirimos, as técnicas metodológicas que aprendemos senão para serem utilizadas em prol da emancipação humana?

De fato, senhoras e senhores, nós temos uma função social. Somos mais do que meros operadores de instrumentos técnicos e teorias científicas. Temos nas mãos a possibilidade de transformação social, pois saber é poder. Somos instrumentos de transformação e, ao mesmo tempo, cidadãos – membros de uma categoria social constituída por pessoas devotadas à busca do bem comum e integrantes de uma comunidade nacional. Daí a emergência de nos conscientizarmos das responsabilidades que nos cabem no uso do conhecimento adquirido em nossas áreas. Devemos estar atentos para o fato de como esse saber será usado para usufruto daqueles que mais necessitam em nosso país: o povo tão pobre e carente de condições sociais que melhorem a sua vida.

Os cientistas e intelectuais num país como o nosso talvez vivam se questionando sobre o seu papel e o seu lugar. A história está “acontecendo”, ela nos rodeia, nos solicita soluções a todo instante e não espera pelos retardatários. Assim sendo, não devemos conceber a idéia dos intelectuais neutros, que fabricam o seu silêncio perante a realidade social ao se enclausurassem em seus debates técnicos. Não devemos nos conformar em compreender o mundo, devemos transformá-lo com o conhecimento adquirido. Nossa função é servir à população como um todo, desenvolvendo saberes e mecanismos capazes de intervirem na vida daqueles que necessitam de nossos serviços.

Desse modo, o conhecimento torna-se unidade entre a ação e a idéia, entre práxis e teoria, pois a reflexão teórica não se faz descolada da realidade social. Esta relação entre intelectual e sociedade não é uma abstração, é algo tão concreto como um dia após o outro. E, talvez, seja esta relação o lugar que deve o intelectual/cientista não abrir mão, independente de sua origem ou área do saber científico. Este lugar não é um espaço teorético, é um local concreto, palpável, capaz de condicionar a atividade científica rumo à concretização da liberdade dos homens. Os instrumentos técnicos utilizados pelo homem podem coisificá-lo, aliena-lo das potencialidades de sua existência. Por isso, devemos refletir sobre o uso e conseqüências desses mecanismos oriundos da produção científica.

Lembrem-se caros colegas de formatura, a tecnologia que liberta é a mesma que aprisiona. Temos um papel transformador, tais quais os instrumentos que temos nas mãos. Somos profissionais oriundos da Universidade e temos o dever de nos aproximarmos da sociedade. Temos uma dívida para com ela e para com o nosso país. Vivemos num Brasil com milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza, onde apenas uma pequena parcela da população consegue obter um diploma de nível superior. Nosso maior desafio é pensarmos qual o tipo de sociedade desejamos e, para isso, devemos enxergar além das “sombras das cavernas técnicas” nas quais estamos inseridos. A função social do conhecimento, a qual contempla a razão como instrumento em prol da emancipação humana deve ser uma meta buscada e atingida por todos nós!

Por fim, aos que nos ajudaram nessa grande batalha, o nosso eterno agradecimento. São professores e pais que nos incentivaram em cada momento de nossa graduação. Aliás, que os meus queridos pais possam representar neste momento o amor e dedicação de cada um dos pais aqui presentes. Parabéns a todos os formandos, que todos tenham um grande cavalgar profissional neste ano que se inicia e que ele possa trazer novos e gloriosos prenúncios de grandes conquistas a cada um de nós.

Obrigado a todos e boa sorte!

A Natureza Em Questão - A Poluição das Bacias Hidrográficas de Fortaleza

por Dennis de Oliveira Santos



Fortaleza vê-se mais uma vez envolvida numa catastrófica problemática a respeito de questões ambientais. Através da mídia recebemos duras denúncias da ausência de projetos ambientais para a preservação dos rios Ceará, Maranguapinho e Siqueira; seja um parque ecológico ou qualquer outro tipo de projeto que vise à preservação ambiental desses três rios.

Diante deste fato podemos construir uma indagação para refletirmos acerca do assunto: qual é a solução numa perspectiva sócio-ambiental para a preservação dos rios Ceará, Maranguapinho, Siqueira e seus entornos e mangues? Tentaremos então esboçar uma possível solução com fundamentos sociológicos para tal problemática.
Na construção da nossa própria indagação podemos obter uma possível solução para a degradação destes ambientes; devemos buscar um caminho que preze para a preservação ambiental, mas que ao mesmo tempo integre em seu intuito o desenvolvimento social das populações e empresas que utilizam os recursos naturais destes rios. Uma intensa integração das iniciativas estatais, privadas e populares, que com o constante diálogo e ações conjuntas dentre essas instituições, busquem caminhos para a reestruturação ambiental destes rios.

Sendo assim, a primeira iniciativa seria tomada pelo Estado, que é de executar leis ambientais que condenem duramente empresas que poluem estes rios com elementos químicos que não são absorvidos pela natureza, essa ação deve ser feita em primeira instância, visando antes tudo tentar minimizar a forte degradação ambiental nos rios, que atualmente é dada através de inúmeros detritos urbanos que são jogados em suas margens. Sabemos que as leis ambientais foram recentemente criadas, porém, elas já estão suficientes instauradas no âmbito de leis para que administração pública possa desempenhar seu papel de protetora de redutos ambientais, atitude que atualmente não é exercida pelos governantes que administram as regiões destes rios. Costume genuinamente da práxis da política brasileira: há leis bem construídas acerca de alguma mazela social, porém o governante brasileiro não tem o costume de usá-las diante da sociedade.

A segunda iniciativa seria uma parceria entre as instituições estatais e privadas, visando preservar o meio ambiente com projetos que estimule as empresas a participarem no execução de soluções técnicas para o problema. Por exemplo, uma solução técnica dada se baseia em que as empresas enviem seus detritos industriais diretamente para uma área de tratamento de água, que sendo devidamente tratada, poderá ser reaproveitada para o abastecimento de água para a população. Solução técnica onde a iniciativa privada sai ganhando por não está à mercê de leis ambientais que lhe puna por está poluindo os rios, e o governo exerce o seu papel de administrador público, criando um sistema que interligue diretamente as empresas com áreas de reaproveitamento de recursos hídricos, onde além de inibir a poluição, favorece a população com uma fonte a mais de recursos hídricos.

Porém, sabemos que tais projetos podem até ser pensados e criados pelo Estado, mas na maioria das vezes não é executado em função de crises administrativas, ausência de empenho estatal ou por problemas burocráticos em geral. Então é neste contexto que entra a terceira iniciativa, e talvez a mais decisiva para a preservação ambiental dos rios cearenses. Esse terceiro passo é dado através de uma demasiada cobrança da população frente ao Estado. Afinal, o cidadão que paga imposto e elege seus governantes, tem em suas mãos a forte arma da mobilização comunitária. Momento onde a comunidade esteja constantemente revogando pela execução destes projetos, forme passeatas, esteja constantemente se mobilizando através de duras críticas diante da ausência de empenho de seus governantes.

Assim, o Estado sendo duramente cobrado por seus cidadãos, desenvolveria soluções técnicas como: desenvolvimento sustentável para a população, educação ambiental nas esferas educacionais, criação de parques ambientais, aproveitamento dos recursos minerais com consciência e etc. Projetos que além de preservarem o meio ambiente e educar as comunidades entorno destes rios, geram mais um meio de produção econômica para a população.

Enfim, soluções para questões ambientais como esta só podem ser buscadas a partir de um intenso agir e diálogo entre o Estado, a iniciativa privada e as camadas populares. Neste contexto, de uma perspectiva sócio-ambiental, é que desenvolveremos leis ambientais e soluções técnicas que além de preservar o meio ambiente, favoreça as empresas e contribua para o desenvolvimento social da população.

domingo, 13 de março de 2011

O MAL ESTAR DA MODERNIDADE NA LITERATURA DE GRACILIANO RAMOS

por Dennis de Oliveira Santos



O ilustre escritor alagoano Graciliano Ramos além de vários temas sobre política e sociedade em sua vasta obra literária também teve o êxito de delinear uma visão pessimista, típica de intelectuais do século XX acerca da relativização do ideário de felicidade do mundo ocidental contemporâneo. Pode-se perceber que ele delineou a impossibilidade de construção de um “estado de bem-estar” aos indivíduos no mundo ocidental contemporâneo a partir de uma específica visão de mundo confeccionada nos respectivos romances: São Bernardo (1934) e Angústia (1936).

O início do século XX foi marcado pela idéia de nação e progresso, temas que seriam capazes de modernizar o mundo através das descobertas científicas e dos avanços tecnológicos. Seja nos países europeus ou na América Latina, os governantes tinham o intuito de levarem adiante a concepção de Estado-nação, de possuírem uma bandeira, um hino, exército próprio e, em alguns casos, até a possibilidade do sufrágio universal.

Na Europa, por exemplo, a sociedade via com otimismo a evolução tecnológica e o exacerbado nacionalismo de certos países desse continente. Afinal, o progresso, o “curso natural dos acontecimentos”, podia ser visto no uso das máquinas, no militarismo e na civilização. No âmbito das ciências físicas e biológicas reinava a concepção positivista, a qual norteava a ação dos cientistas: não havia problema que a atividade científica, objetiva e neutra não resolvesse (HOBSBAWN, 1995).

Assim, as cidades eram milimetricamente organizadas, o modo de produzir carros em grande escala era desenvolvido por Henry Ford, aviões podiam ser vistos nos céus graças a Santos Dumont, e as descobertas de Darwin “sepultava” as explicações místicas acerca da origem da vida terrestre (HARVEY, 1994). No Brasil, na década de 30, o estado varguista modernizava a economia local a partir do processo de industrialização (FERNANDES, 2006; IANNI, 1988). Enfim, não havia dúvida de que o “homem evolui”, se adapta, assim como a sociedade progride, se eleva, melhora.

No entanto, antes mesmo da crítica acerca da instrumentalização da razão feita pela Escola de Frankfurt, antes do existencialismo de Camus e Sartre diante da certeza da impossibilidade de “ser feliz”, intelectuais do início do século XX, como o romancista Franz Kafka, não se entusiasmavam com as premissas ideológicas advindas da ciência. Tais intelectuais confeccionaram uma visão de profundo pessimismo sobre a realidade: era o mal estar moderno do homem perante a constante racionalização ocorrida no mundo (BAUMAN, 1998).

Em meio à ideologia do progresso, no Brasil, tão enfatizada pelo Presidente Getúlio Vargas, o alagoano Graciliano Ramos (1892-1953) chamou atenção para a existência de entraves para o “bem estar” dos indivíduos perante a sociedade, de estruturas “intransponíveis” entre o querer e o poder, entre o sujeito e as instituições sociais. Em dois de seus romances, São Bernardo (1934) e Angústia (1936), é o sistema econômico-social capitalista e, em termos gerais, é a própria sociedade estruturada pelo conflito entre as classes sociais, a estrutura responsável por diversas desigualdades sociais e, conseqüentemente, pela infelicidade e insegurança dos homens.

Nessas obras existe um conflito entre o indivíduo, ao mesmo tempo culpado e inocente pelas mazelas de seu mundo, e a sociedade, já instituída com seus valores e regras normalizadas. Quer dizer, os romances do literato nordestino traduzem artisticamente o sentimento de mal estar, de antipatia que os sujeitos dessa época sentiam ao compartilharem determinados valores e regras.

Graciliano é cruelmente real, mesmo os desejos dos seus personagens não fogem aos limites determinados por suas órbitas sociais. Ambos os romances denunciam o absurdo da existência humana em uma época em que se acreditava na possibilidade de construção de uma sociedade perfeita. Em São Bernardo se revela o que absurdo é o fato dos seres humanos, tão “evoluídos” neste mundo cercado de tecnologias, não passarem de mercadorias com preço, validade e garantia. Essa coisificação humana é percebida no cotidiano e ações dos personagens.
Narrado por Paulo Honório (personagem principal) em primeira pessoa, o texto assume características de uma “meia-culpa”, de uma busca de compreensão do que fora sua vida. No enredo do romance, este narrador era empregado de uma fazenda em Alagoas, e com trabalho lícito e esforços ilícitos consegue comprá-la, a qual ele pensa em transformar no latifúndio mais produtivo da região (RAMOS, 1996).

Desse contexto, observa-se que Paulo Honório é o típico fazendeiro capitalista, o intrépido desbravador, o qual apropria-se de tudo e de todos, mas que apesar de sua privilegiada posição social, ele é abalado por complexos sentimentos e por sensações de alucinação psíquica (LINS, 1998). A partir desse enredo, percebe-se uma visão de mundo pautada num constante mal estar dos indivíduos perante seu contexto social: o homem cria para si estruturas sociais que acabam por gerar graves problemas, aprisionando a si mesmo dentre desse sistema social criado por ele mesmo. Ou seja, existe uma luta do homem contra o mundo exterior corrompido.

Já no romance Angústia, o personagem Luís da Silva representa a figura de um fracassado. Ele possui um sentimento de angústia, o qual reside no fato dele ter que conviver com pessoas que ele detesta, mas assim o faz a partir de certas artimanhas e jogos sociais para se manter em seu cargo público e conquistar o coração de Marina. A mensagem de Graciliano nesse texto parece ser a seguinte: a única maneira de “vencer” em um mundo regido pelo dinheiro e, assim, parecer mais feliz, é seguindo as “regras do jogo”, mostrando ambição e vontade empresarial. Porém, no final do livro, o personagem chega a conclusão de que não é e nunca poderia ser feliz. Afinal, ele pensa que a vida não tem sentido nem finalidade (RAMOS, 1969).

Os atos dos personagens de Graciliano são justificados por si mesmo, fora de qualquer preocupação moral ou transcendente. Eles estão entregues aos seus próprios destinos, não contam sequer com a compaixão do escritor. Dessa forma, os homens são retratados como seres desgraçados, criaturas humilhadas e mesquinhas, os quais sentem um profundo mal estar perante suas vidas e o meio que os cercam:

A ascensão de Paulo Honório ou a decadência de Luís da Silva representam caminhos diferentes para o mesmo niilismo. (...) Não encontram sentido para a vida, não se associam nem se solidarizam em movimentos de ascensão; carregam, com a ausência de fé, um tamanho de poder de negação que só se encontra correspondência numa espécie de niilismo moral, num desejo secreto de aniquilamento e destruição (LINS, 1998, p. 133-137).

Diante de tais considerações detecta-se que a obra literária de Graciliano Ramos ilustra artisticamente o mal estar social da modernidade, assunto que é tão debatido no âmbito das ciências humanas (BAUMAN, 1998). Daí a importância de se estudar a produção do escritor alagoano, momento em que seus romances chamam atenção para a existência de um processo de burocracia, o qual tende a esmagar as autonomias individuais (WEBER, 2002) e gerar um mal estar aos sujeitos.

REFEFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAUMAN, Zigmunt. O mal estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5ed. São Paulo: Globo, 2006.

HARVEY, David. A condição pós-moderna. 4ed. São Paulo: Loyola, 1994.

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos - o breve século XX. 10ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

IANNI, Octavio. Estado e capitalismo. 2ed. São Paulo: Brasiliense, 1988.

LINS, Alvaro. Valores e misérias das vidas secas. In: RAMOS, Graciliano. Vidas secas. 73ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.

RAMOS, Graciliano. Angústia. 11ed. São Paulo: Martins, 1969.

______. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 1996.

WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Martin Claret, 2002.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Problemas Ambientais do Rio Cocó

por Dennis de Oliveira Santos



Considerações Iniciais
O Rio Cocó é o principal recurso hídrico de Fortaleza. Possui sua nascente na Serra de Aratanha e tem uma extensão de 45 Km. Ele é afluente do Rio Ceará e se estende por diversas áreas urbanas da cidade, encontrando-se, por fim, com o mar, na praia Caça e Pesca. Possui cerca de 30 afluentes, 16 açudes e 36 lagoas. Em seu baixo curso cerca de 16 Km a montante de sua foz observa-se um exuberante manguezal, ocupando uma área equivalente a 402 hectares, e sua bacia corresponde a 2/3 da área do município de Fortaleza (PARQUE VIVO, 2003).

Sem dúvida, este rico ecossistema, onde a vida se manifesta por todos os lados, possuidor de uma extensa fauna e flora, de rico solo, deve ser um tema de constante discussão por parte da população fortalezense e seus governantes. Seja por sua relevância ambiental, o Rio Cocó sempre deve ser objeto de preservação e aproveitamento equilibrado de seus recursos. Diante este contexto, projeta-se a seguinte indagação: qual a postura do Estado na preservação dos recursos hídricos do rio Cocó?

Procedimentos Metodológicos
Essa pesquisa foi desenvolvida a partir de uma perspectiva baseada na Sociologia Urbana (SOUZA, 2003), na qual se utilizou os seguintes procedimentos metodológicos: a primeira etapa foi à coleta de dados e estudo de textos elaborados por teóricos do planejamento urbano. Em seguida foi coletado material sobre os projetos da administração pública. E a seguir, os projetos estatais entorno do tema foram analisados e contextualizados com a Constituição Federal (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1989) e o conjunto de leis jurídicas do Direito Ambiental (MACHADO, 2004).

As Ações Governamentais
Através de uma observação empírica sobre a atual situação do Rio Cocó, percebe-se que devastadores ações da sociedade vem ocasionando problemas ambientais para este recurso hídrico. Diante deste contexto de desintegridade ambiental e descaso com as questões ecológicas, o que se tem sido discutido e feito no âmbito da administração pública? Para elucidar essas indagações, adota-se como base os documentos oficiais do poder público sobre a questão ecológica. Para isso, analisa-se as leis provindas do Direito Ambiental, procurando verificar se esse instrumento legal é cumprido pelo Estado, e de que forma.

Vale lembrar que o Direito Ambiental é um ramo jurídico público que se ocupa dos princípios e normas destinados a impedir a degradação dos elementos da natureza, objetivando assegurar à população uma melhor qualidade de vida. Ele é o conjunto de técnicas, regras e instrumentos legais organicamente estruturados para assegurar um comportamento que não atente contra a sanidade do meio ambiente, o que permite o uso racional e sustentado dos recursos naturais (EUFRÁSIO, 2000).

O Direito Ambiental alia o Estado aos especialistas no sentido da elaboração de projetos das ações governamentais sobre as questões do meio ambiente. Porém, o que se observa em quesito de ações públicas em torno do Rio Cocó são ações produzidas de uma ineficácia de projetos e não cumprimento das leis vigentes. O licenciamento ambiental, por exemplo, prescrito na resolução Conama, nº 237, estabelece que compete ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da lei nº 6938, de empreendimentos e atividades com significado impacto ambiental de âmbito nacional ou regional.

Essa regulamentação jurídica é cumprida pelo Estado? A reposta é não. O maior exemplo dessa negligência estatal iniciou-se em Dezembro de 2002, quando a Prefeitura de Fortaleza prontificou-se a construção de uma ponte sobre a foz do Rio Cocó. O principal objetivo dessa obra, de acordo com a Prefeitura Municipal, seria a interligação da Praia do Futuro com a Praia de Sabiaguaba, dando assim acesso direto às praias do litoral leste de Fortaleza. No entanto, esse projeto, embora aprovado pelo IBAMA, não teve o seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) analisados pelo Conselho Municipal do Meio Ambiente (CONAM), tão pouco pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (MEIO AMBIENTE, 2004).
Nesse contexto, técnicos e moradores do entorno da Praia do Futuro não tiveram a possibilidade de discutir e analisar o projeto antes do início de sua execução. O que fere uma lei da Constituição Federal, que afirma que compete aos poderes legislativos e executivos municipal, no processo de elaboração e na fiscalização de implementação do plano diretor, garantir a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas de vários segmentos da comunidade (PINTO, 2004).

Em resposta ao problema, a SEMACE, em seu informativo mensal, publicou reportagens de audiências públicas sobre questões que não são tão urgentes e essenciais como o caso da poluição do Rio Cocó. O texto enfatiza que a Agenda 21 foi discutida na cidade de Bela Cruz com a presença do Poder Público e da sociedade local. Em outro trecho, argumenta que visa-se sensibilizar e incentivar a implantação da Agenda 21 no município (AMBIENTE DO CEARÁ, 2003). Porém, o que se sabe é que após essa audiência nada mais foi executado.

Como foi dito anteriormente, diversos detritos industriais são jogados no Rio Cocó, como é o caso de seu afluente, a Lagoa do Porangabussu, infligindo, portanto, a Legislação Federal do Conselho Nacional do Meio Ambiente, que na resolução Conama, nº 001, artigo 5, afirma que se deve definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual de localiza. Ato que também contraria a lei estadual nº 13.103 da política estadual de resíduos sólidos, a qual, de acordo com o Inventário de Resíduos Sólidos Industriais, determina ser o gerador responsável pelo resíduo, desde a sua geração até o destino final (AMBIENTE DO CEARÁ, 2004).

Diante dessas ações devastadoras para o desequilíbrio ambiental do Rio Cocó, o setor industrial é punido por tais atos? Mais uma vez a administração pública se ausenta face aos devidos cumprimentos jurídicos, ferindo outra resolução, a Conama, nº 007, artigo 38, que enfatiza que os Estados, territórios e o Distrito Federal, através dos respectivos órgãos de controle ambiental, deverão exercer sua atividade orientadora, fiscalizadora e punitiva das atividades potencialmente poluidoras instaladas em seu território, ainda que os corpos de água prejudicados não sejam de seu domínio ou jurisdição.

Quanto à ineficácia nas aplicações dessas leis, diante de um governo que visa atender apenas uma parte da população com os elementos necessários de saneamento básico, vale destacar outra infração dos procedimentos jurídicos, que afirma, no 2ª artigo da Constituição Federal, o seguinte: a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes sociais – garantia do direito à cidade sustentável, entendido como direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental (PINTO, 2004).

Como resultante desse contexto de ineficácia das leis referentes às questões ambientais, o atual sistema de drenagem no Rio Cocó tem grande parte de seus cursos de água poluídos por diversas canalizações. Isto tudo se agrava devido à topografia plana da cidade, que apresenta grandes dificuldades de escoamento das águas. Problema que é percebido no período das chuvas, quando enchentes são freqüentes nos locais mais urbanizados da cidade.

Vale também ressaltar que Fortaleza apresenta graves problemas ambientais a respeito do tratamento de seu lixo. Depositado em locais como beiras de avenidas, áreas de moradia, terrenos vazios e, principalmente, próximos aos recursos hídricos, os resíduos sólidos poluem os solos através dos processos de infiltração. Além disso, o escoamento superficial de impurezas tende a provocar o assoreamento e a contaminação dos cursos de água.

A questão do que fazer com o lixo produzido é um sério problema ambiental. Não existe na prática a coleta diferenciada, visto que, o município recicla ao mês 1% dos 31 possíveis para o lixo urbano (AMBIENTE DO CEARÁ, 2003). Para agravar ainda mais tal situação, a Ecofor ainda adota uma política de beneficiamento na coleta de lixo apenas para os bairros de elite da cidade. Fato comprovado em seu Calendário da Coleta Domiciliar, que diz que na Aldeota a coleta é feita duas vezes ao dia enquanto em bairros periféricos é feito apenas uma vez ao dia, como é o caso da Aerolânida (ECOFOR, 2004).

Ao final, detecta-se inúmeros erros de planejamento urbano, má execução das leis jurídicas e limitadas discussões sobre o tema por parte da administração pública. Fica a concepção de que o meio ambiente no município de Fortaleza padece mais por inaplicação das leis especificas ao invés da suposta inexistência das mesmas. São sintomas de uma administração pública baseada num planejamento urbano meramente técnico.

Considerações Finais
Percebe-se que as ações provindas da administração pública são decorrentes de inúmeros erros de planejamento urbano, má execução das leis jurídicas e limitadas discussões sobre o tema por parte desta instituição. Existe uma certa consistência e concretização de dados coletados e analisados por documentos como o Inventário Ambiental e do Inventário de Resíduos Sólidos Industriais, que auxiliam na execução do Plano Diretor. Porém, o Rio Cocó é marginalizado de projetos e ações que inibem a sua degradação ambiental, o que já é concretizado em outras regiões do estado do Ceará. O que também é bem observado diante da ausência no cumprimento das leis já vigentes, sendo que nenhuma lei foi criada em específico para as principais áreas urbanas por onde passa o rio. Enfim, vê-se um contexto de incapacidade pública, que é um elemento crucial para que o mais importante recurso hídrico de Fortaleza se torne cada dia mais desintegrado ambientalmente.


Referências Bibliográficas

ECOFOR. Calendário da Coleta Domiciliar. Fortaleza: ECOFOR, 2004.

EUFRÁSIO, Carlos. Direito Ambiental. Fortaleza: UNIFOR, 2000.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MEIO AMBIENTE DO CEARÁ (IBAMA), Instituto Brasileiro do. Educação no Processo de Gestão Ambiental. Fortaleza: IBAMA, 2004.

MEIO AMBIENTE DO CEARÁ, Superintendência Estadual do. Informativo Mensal da SEMACE. Fortaleza: SEMACE, 2003a.

______. Inventário de Resíduos Sólidos Industriais. Fortaleza: SEMACE, 2004.

______. Plano de Gerenciamento das Bacias Metropolitanas. Fortaleza: SEMACE, 2003.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1989.

PARQUE VIVO, Projeto. O Manguezal do Rio Cocó e o Parque Adahil Barreto. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará (UFC), 2003.

PINTO, Antônio Luiz de Toledo (org.). Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2004.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Abc do Desenvolvimento Urbano. Rio de Janeiro: Bertrand, 2003.

O Samba como Instrumento de Resistência da Cultura Popular Brasileira

por Dennis de Oliveira Santos



Após o fim da ditadura militar no país, várias manifestações populares, que foram proibidas de serem praticadas pelos aparelhos estatais de censura, começaram a serem resgatadas por estudiosos de nossa realidade social. Havia, nesse momento, o interesse de se “(re)conhecer” a cultura popular brasileira, que nasce na vida cotidiana de nosso povo como fenômeno histórico enraizado em nossa realidade sócio-cultural, mas que, gradativamente, ao longo das décadas do século XX, foi sendo marginalizada pelo Estado e por determinadas concepções da sociedade civil brasileira.

É nesse contexto que se insere o samba, genuíno estilo musical brasileiro, permeado de criatividade reflexiva acerca de nossas relações sociais, mas que foi marginalizado pelas camadas abastadas locais. O que culminou na etnocêntrica concepção de que este tipo de música é vulgar e degenerada em relação a outros estilos musicais (música erudita, por exemplo), e de que os compositores do gênero são ignorantes ou “alienados” dos temas políticos e históricos. Diante disso, quais aspectos sociais presentes no samba revelam a sua importância cultural para a formação identitária do brasileiro?

Metodologicamente o assunto é captado através do materialismo histórico anti-economicista, o qual é baseado numa concepção dialética acerca das atividades humanas, no qual se pretende estudar o desenvolvimento histórico de uma concepção de mundo à luz da construção teórico crítica. Para que isso seja efetivado, esse método acontece num processo contínuo, permanente, que através da reconstrução do processo histórico da referida visão de mundo, consegue captar os elementos que determinaram à estabilização dessa concepção analisada, para que assim se possa responder aos problemas atuais do momento histórico em discussão (GRAMSCI, 1966).

O samba é um estilo musical de raízes africanas, surgida da fusão de várias manifestações culturais dos ex-escravos, como a dança do côco, festas de terreiros, pernadas de capoeira, e o uso de palmas, pandeiros, pratos e facas para marcar o ritmo. Esse segmento musical surgiu na Bahia, nos fins do século XIX, mas com a abolição da escravatura (1888), a migração de afro-baianos para o Rio de Janeiro se tornou especialmente forte. E nas favelas e camadas populares da capital do país na época, o samba se legitimou como fluente forma de manifestação cultural das classes sociais excluídas as atenções do Estado (VIANNA, 1995).

Isso se deve ao preconceito presente historicamente no seio da sociedade brasileira, que tende a distinguir dois planos culturais no Brasil: o erudito, marcado pela branquitude e “refinamentos” de europeidade; e o popular, das camadas subalternas, que apesar de toda sua criatividade, é tachado pelas elites de vulgar e pouco criativo (VANNUCCHI, 2002).

Porém, a partir dos anos 20, o samba tem sua ascensão social na pulsação morro/cidade. E o estilo se tornou um foro privilegiado de discussão sobre as grandes questões nacionais. As desigualdades sociais, a insuficiência do Estado, a aculturação de nossos hábitos, tornaram-se temas bastante adequados nas letras dos sambistas. Sátiras, comentários políticos, críticas sociais, incidentes do cotidiano – todos esses motivos temáticos se fazem presentes no samba (SODRÉ, 1979).

Desse modo, surgem uma gama de aspectos sociais que sustentam a legitimidade social do samba. E um deles é a sátira, muito utilizado nas canções do paulista Adoniran Barbosa. Na música intitulada “Conselho de Mulher”, o filho de imigrantes italianos reproduz intencionalmente erros gramaticais na letra da música como forma de protesto diante do “linguajar adornado” e “bem falado aos cânones dicionarescos” das elites. Além de tecer críticas às injustas condições da divisão social do trabalho capitalista, que através da ideologia do progresso, explora a mão de obra operária para consolidar a acumulação do capital. É o que se observa em trechos de sua obra:

Pogressio, pogressio.
Eu sempre iscuitei falar, pogressio vem do trabaio,
Então amanhã cedo, nóis vai trabalhar.
(...)
Quanto tempo nóis perdeu na boemia.
Sambando noite e dia, cortando uma rama sem parar.
Agora iscuitando o conselho da mulher.
Amanhã vou trabalhar, se deus quiser, mas deus não quer! (BARBOSA, 1975).

A postura de criticidade frente a impunidade dos governantes/sistemas judiciais e as desigualdades sociais é outro aspecto presente no samba. Na música “Vítimas da Sociedade”, o morador das favelas cariocas, Bezerra da Silva, descreve a realidade social de um povo faminto e marginalizado através do estigma de que “todo sujeito que mora na favela é ladrão”. Além de descrever as desigualdades econômicas entre as classes sociais, quando comenta acerca da falta de alimentos aos pobres em contraposição ao consumismo exacerbado do rico, o sambista tece críticas ao sistema judiciário e sua impunidade aos crimes de “colarinho branco” cometido por nossos governantes. Vejamos a letra:

Só porque moro no morro
A minha miséria a vocês despertou
A verdade é que vivo com fome
Nunca roubei ninguém, sou um trabalhador
Se há um assalto à banco
Como não podem prender o poderoso chefão
Aí os jornais vêm logo dizendo que aqui no morro só mora ladrão
(...)
Se vocês estão a fim de prender o ladrão
Podem voltar pelo mesmo caminho
O ladrão está escondido lá embaixo
Atrás da gravata e do colarinho
(...)
Somos vítimas de uma sociedade
Famigerada e cheia de malícias
No morro ninguém tem milhões de dólares
Depositados nos bancos da Suíça (SILVA, 1985).

A resistência popular diante da aculturação de nossos hábitos em função da influencia estrangeira é outra marca do samba (CHAUÍ, 1986). Noel Rosa, na música “Não Tem Tradução”, critica os efeitos da influência de palavras e costumes franceses e norte-americanos, que tendem a transplantar aspectos culturais exóticos a nossa realidade social. Ação que vai progressivamente transformando o modo de agir de nosso povo. Assim diz a crítica do músico carioca:

O cinema falado é o grande culpado da transformação
Dessa gente que sente que um barracão prende mais que o xadrez
(...)
A gíria que o nosso morro criou
Bem cedo a cidade aceitou e usou
Mais tarde o malandro deixou de sambar, dando pinote
E só querendo dançar o Fox-Trote
(...)
Amor lá no morro é amor pra chuchu
As rimas do samba não são I love you
E esse negócio de alô, alô boy e alô Johnny
Só pode ser conversa de telefone (ROSA, 07/08/2007).

Enfim, percebe-se que o samba é uma manifestação popular bastante criativa e reflexiva diante de nossas relações sociais. Através de aspectos sociais como a sátira, a criticidade e a resistência popular, esse estilo musical apresenta as inquietações de sua sociedade: as desigualdades sociais, a aculturação de hábitos, as impunidades judiciais, etc. Tornando-se um discurso tático de resistência dos excluídos no interior do campo ideológico do modo de produção dominante – o samba é ao mesmo tempo um movimento de continuidade e afirmação de valores para a identidade do povo brasileiro.

Referências Bibliográficas

BARBOSA, Adoniran. Adoniran Baborsa. São Paulo: Odeon, 1975. 1 disco compact (45 min): digital, estéreo.

CHAUÍ, Marilena. Conformismo e Resistência: aspectos da cultura popular brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1986.

DAMATTA, Roberto. Carnavais, Malandros e Heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. 5ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1990.

GRAMSCI, Antonio. Concepção Dialética da História. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.

ROSA, Noel. Não tem Tradução. Disponível em: . Acesso em: 7 de Agosto de 2007.

SILVA, Bezerra da. Malandro Rife. São Paulo: Rca Vik, 1985. 1 disco compact (39 min): digital, estéreo.

SODRÉ, Muniz. Samba, o Dono do Corpo. Rio de Janeiro: CODECRI, 1979.

VANNUCCHI, Aldo. Cultura Brasileira: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2002.

VIANNA, Hermano. O Mistério do Samba. Rio de Janeiro: Zahar, 1995.

O ORDENAMENTO URBANO DO PODER LEGISLATIVO NA PROVÍNCIA DO CEARÁ (1838 – 1880)

por Dennis de Oliveira Santos




Considerações Iniciais
Com o fim do período colonial, dar-se início a um novo ciclo histórico no Brasil, momento em que a política nacional foi marcada por uma forte centralização administrativa e teve o surgimento de vários personagens políticos que fizeram história no campo político cearense (José Pereira Filgueiras, Rodolfo Teófilo, José Martiniano de Alencar, Tristão de Alencar Araripe, etc), época conhecida como Brasil Imperial.

Mas foi entre os anos de 1822 e 1888 que grandes mudanças ocorreram no país, principalmente em suas províncias, onde novas idéias, ligadas ao cientificismo e ao liberalismo político modificaram suas estruturas tradicionais do poder e abriram caminhos para a abolição da escravatura e a instauração da República. O Brasil vivenciou um constante processo de transformação, como a grande produção cafeeira e o processo de libertação dos escravos, mudanças sociais que trouxeram progressos em suas estruturas, principalmente na esfera econômica, política e social.
Na Província do Ceará não foi diferente. Com o desenvolvimento de sua economia assentada na atividade pecuária, em que as charqueadas foram responsáveis pelo crescimento de alguns centros comerciais da capitania, os produtos sofreram uma valorização com a introdução do algodão em sua economia, servindo primordialmente como produto de exportação para o comércio europeu. Ainda isso não bastasse, outros produtos foram anexados a pauta de exportação, contribuindo para que o Ceará fosse um exemplo exportador de produtos primários.

A segunda metade do século XIX foi um período de grandes transformações na infra-estrutura e nos órgãos políticos da região cearense: época em que foi instalada a Assembléia Legislativa da Província do Ceará. A partir de então, esse poder foi responsável pelo ordenamento urbano dos municípios locais através da criação de normas jurídicas e políticas públicas. Diante desse contexto, é de relevante importância analisar como se deu o ordenamento urbano pelo poder legislativo cearense entre os anos de 1838 e 1880, verificando suas finalidades e conseqüências sociais para a província do Ceará.

Ceará Imperial
Alguns fatores foram de fundamental importância para que esse desenvolvimento do Ceará ocorresse com êxito: um período sem o registro de secas (1845 a 1877) e a demanda de algodão em face de Guerra Civil Americana. O Ceará permaneceu até o fim do século XVIII como uma capitania sem importância. Porém, quando se tornou província, e foi administrado por governadores com poderes mais diretos (José Pereira Filgueiras, José Martiniano de Alencar, Joaquim Pinto Madeira) tornou-se notável a capacidade de se mobilizar muitas pessoas para enfrentar o campo político (SOUSA, 1994).

A estrutura jurídica e o poder político no Ceará Imperial foram configurados pela Constituição outorgada de 1824, em que se instaurou o modelo de governo Monárquico-Hereditário, que era constitucional e representativo. Nessa estrutura política, representavam o país, o Imperador e a Assembléia-Geral, formada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

A Constituição de 1824 instituiu quatro poderes: O Executivo – onde o Imperador era o líder máximo, em que os seus Ministros de Estado o representava; o Moderador, pelo Imperador; o Judiciário, pelos Juízes e Jurados, e o Legislativo, pela Câmara dos Deputados e Senado. Essa conjuntura política, lançada pela Constituição de 1824, seguiu por vários anos, momento em que as bases jurídicas da política local, no Império, foram igualmente lançadas pela Constituição Imperial e por outras leis menores que se seguiram nas duas décadas seguintes. Nesse ínterim, surgiram as províncias, que eram divisões territoriais em sintonia com o Governo Central pelas agências instituídas nos níveis civis, onde o Presidente da Província era quem dirigia e operacionalizava suas funções e atribuições.

Os partidos políticos do Ceará começaram a se organizar após a Confederação do Equador, momento em que autoridades das regiões provinciais organizavam-se em pequenos grupos para as discussões em nível local e nacional. Geralmente esses líderes possuíam um grande poder em suas localidades. Esses partidos deram aos chefes políticos suporte para manter sua hegemonia em cada vila, aumentando e legitimando seu poder de mando local.

A Confederação do Equador foi um movimento revolucionário, de caráter emancipacionista e republicano, ocorrido em 1824 no Nordeste do Brasil. Representou a principal reação contra a tendência absolutista e a política centralizadora do governo de D. Pedro I (1822-1831), esboçadas na Carta Outorgada de 1824, a primeira Constituição do país.

Nesse contexto, dois partidos sobressaíram no Império brasileiro, ambos trazendo à tona a questão da descentralização e da centralização político-administrativa. O Liberal, que defendia as leis descentralizadoras, os interesses da burguesia urbana e comercial da época e, propunha o reformismo progressista das classes sem compromissos diretos com a escravidão e os donos de terra. E o Partido Conservador, que defendia a centralização e a manutenção da dominação política das elites escravocratas rurais.

Após o surgimento da Assembléia Provincial do Ceará em 1835, esses partidos ganharam maior relevância. No ano de 1834, foi nomeado Presidente da Província José Martiniano de Alencar, que tinha o perfil de intolerante e autoritário no gerenciamento da província, causando a ira de grupos opositores a seu governo. Sua postura na condução dos negócios provinciais causou insatisfação nos grupos de oposição, os quais passaram a organizar-se e a recrutar novos elementos, com capacidade intelectual adquirido nos cursos superiores (SOUSA, 1994).

A oposição começou a entrar em cena com o fim do Governo Alencar no Ceará. Organizaram-se dentro do partido Conservador, sob a liderança de poderosas famílias, principalmente a dos Fernandes Vieira, a qual pertencia à região dos Inhamuns. Portanto, é possível perceber que essas agremiações políticas serviam como instrumento de defesa dos interesses de um grupo social muito restrito daquele tempo. Esses partidos surgiram para garantir a hegemonia das oligarquias em suas áreas eleitorais que, não muito distante, correspondiam aos seus próprios domínios territoriais. Os dois Partidos do Império, tanto o Liberal quanto o Conservador não possuíam diferenças em suas práxis políticas, pois sempre estavam de acordos com seus interesses e suas conveniências mais adequadas às situações que apareciam.

A Instalação da Assembléia Provincial
Durante a gestão de José Martiniano de Alencar (1834 a 1837) houve importantes transformações sociais para a região. Essa administração publica desempenhou um importante papel ao desenvolvimento do Ceará e na expansão urbana de Fortaleza. Em 07.04.1835 foi instalada a Assembléia da Província, na Praça do Conselho. Esse ato significou um grande avanço no início da formação da cidade de Fortaleza, tendo em vista a importância do poder administrativo na construção de obras públicas e no ordenamento do espaço urbano (NOGUEIRA, 1889).

De início, esse ambiente político tinha figuras de destaque como o deputado Gonçalo Baptista Vieira (o Barão de Aquiraz). Na pauta diária do Poder Legislativo havia os debates entre os Conservadores e os Liberais e a Campanha Abolicionista. A Assembléia Provincial tinha como objetivo inicial o papel de legislar sobre a economia e a política municipal. Assim como legislar sobre a separação civil, judiciária e eclesiástica; instrução pública; finanças provinciais e municipais; a criação e a supressão de empregos públicos. Além de estabelecer, sob orientação do administrador da casa, a força policial, votar o orçamento provincial sob proposta do Presidente, e dos Municípios sob propostas das Câmaras.

O poder legislativo aproximou representantes da política local com setores mais conservadores, como proprietários de terras que mantinham suas relações de dominação em seu território. Essa instituição funcionou como um canal em que a elite política assegurava a sua dominação ao nível da Província. O Legislativo Provincial, em consonância com a Câmara dos Deputados e o Senado, aumentou a possibilidade de recrutamento da elite local, esses sendo mediados pela ação dos partidos políticos.
Com a criação da Assembléia Legislativa Provincial deu-se início também, a organização dos partidos políticos cearenses. Naquela ocasião, o Presidente da Província era José Martiniano de Alencar, conhecida figura política da região do Cariri e que representava a facção liberal apoiada pelo regente Feijó (GIRÃO, 1985).

João Facundo de Castro Menezes (1838 – 1839)
João Facundo de Castro Menezes, também conhecido como Major Facundo, foi presidente da Assembléia Provincial nos anos de 1838 e 1839. Nasceu no ano de 1787, em Aracati, e faleceu em 1842. Filho do Capitão-mor José de Castro e Silva e de Joana Maria Bezerra, Facundo foi uma das mais influentes personagens políticas que a região cearense teve no período imperial (ESTADO DO CEARÁ, 2006).

O campo político dessa época tinha chegado a momentos de extrema violência e ameaças oriundas da disputa pelo poder entre liberais e conservadores. Nesse contexto, Major Facundo era o líder do Partido Liberal, também conhecido de “chimangos”, grupo político composto de republicanos moderados e antigos imperialistas. Eles tinham por adversário o Partido Conservador, também conhecido por “caranguejo”.

Esse tipo de luta pelo domínio político, que aconteceu entre os anos de 1839 e 1842, repercutiu em todas as províncias do país. No Ceará, enquanto fermentavam profundos rancores partidários, ocorriam saques em propriedades privadas e crimes no interior da província. A situação foi complicada a partir do momento em que o regente Feijó passou o governo a Pedro de Araújo Lima, abrindo espaço a brigas entre liberais e conservadores, marcados por violentos fatos que se sucederam na disputa pela maioridade de D.Pedro II (BARROSO, 1962).

Desse modo, Facundo e os liberais fizeram oposição aos interesses do grupo conservador, estes, tinham o chefe do Partido Liberal como uma “espada suspensa sobre suas cabeças”. O Partido Conservador lutou a todo custo para a manutenção do poder, usando diversas formas de intimidação a Facundo: desde a censura em suas cartas até mensagens com ameaça de morte (LEITE FILHO, 2002).

O posicionamento político de Facundo o levou a ser preso e deportado para uma fortaleza no Rio de Janeiro, da qual saiu por mandato do governo imperial. Na prisão, publicou juntamente com outros companheiros encarcerados, um manifesto-protesto e uma representação ao Imperador. Por todas as ações políticas de Major Facundo, Barão de Studart o considerou a influência política mais legitima na Província do Ceará.

Em sua administração da Assembléia Provincial, ele efetivou através da lei 24 de setembro de 1838, a separação do Poder Legislativo em relação ao Poder Executivo. Se utilizando do regimento interno legislativo, Facundo informou ao governador da Província, o sr. Manoel Felisardo de Souza e Mello, que não existia nenhum artigo que o sujeitasse como presidente de seu órgão a dar conta de suas ações ao governo provincial (ASSEMBLEIA PROVINCIAL, 19/01/1839).

O comunicado do Major Facundo ocasionou novas discussões entre ele o conservador governador da Província do Ceará. Do embate entre os dois interesses (separação entre os poderes X prestação de contas da Assembléia ao Governo Provincial), surgiu outro comunicado. Desta vez, o presidente do legislativo sugeriu que o governador não conhecia os direitos constitucionais, e que seus intuitos em “obrigar” a Assembléia a prestar contas a sua administração eram movidos por suas paixões pessoais sobrepostos aos interesses da sociedade cearense (ASSEMBLEIA PROVINCIAL, 26/01/1839).

A iniciativa de Facundo contra os interesses do governador teve apoio de diversas câmaras municipais, dentre elas a Vila de Aracati. Esse poder municipal comunicou ao imperador D. Pedro II o “desespero geral da província” diante de uma crise política proveniente das ações públicas tomadas pelo governador local, o qual era acusado de ferir as “leis da comunidade brasileira”. Tipo de oposição política que conseguiu que o governador Manoel Felisardo fosse substituído em seu cargo.

Após a sua presidência à frente da Assembléia Provincial, no ano de 1841, Major Facundo foi assassinado barbaramente por questões políticas, em sua própria residência, a mandato da esposa do Brigadeiro José Joaquim Coelho, e de alguns políticos conservadores. O crime abalou a capital cearense, tendo repercussão no país através de inflamados discursos políticos (LEITE FILHO, 2002).

No dia do assassinato, surgiram gritos de protesto e vingança por parte da população. Os liberais prometiam prêmios a quem descobrisse os assassinos. Facundo nunca levou em conta os perigos que corria diariamente, e sua morte foi um ato praticado pela violência política da época, reflexo das tumultuadas agitações que o Brasil vivia. Por esse ambiente de disputas acirradas entre os dois partidos políticos, a gestão legislativa de Facundo foi impossibilitada de modernizar a região cearense com a concretização de um ordenamento urbano em face do conservadorismo político presente na mentalidade dos líderes locais.

TRISTÃO DE ALENCAR ARARIPE (1848-1849)
Tristão de Alencar Araripe foi uma importante figura política do Ceará Imperial, destacando-se como presidente da Assembléia Legislativa Provincial na segunda metade do século XIX. Filho do Coronel Tristão Gonçalves de Alencar Araripe (conhecido pelo seu patriotismo e Presidente da Confederação da República do Equador) e de Ana Triste (a qual passou a ser chamada assim depois da morte do esposo), Araripe jr. exerceu o poder legislativo entre os anos de 1848 a 1849.

Esse personagem da história política cearense era magistrado, formado em Ciências Jurídicas pela Academia de Direito de São Paulo, no ano de 1845. Exerceu diversas funções na área jurídica como: Conselheiro; Juiz Municipal de Fortaleza; Juiz de Direito de Bragança, no Pará; Juiz Especial do Comércio, de Recife; Desembargador das Relações da Bahia e de São Paulo (das quais foi presidente) e da Corte; Ministro do Supremo Tribunal; Ministro da Justiça e da Fazenda, no governo de Deodoro (ESTADO DO CEARA, 2006).

No âmbito político, Tristão de Alencar Araripe foi Presidente das Províncias do Rio Grande do Sul e do Pará; foi Deputado Estadual em três legislaturas, além de exercer o cargo mais alto do Legislativo Estadual cearense, a Presidência da Assembléia Legislativa. Além de todos esses afazeres, ele ainda economizava tempo para se dedicar às obras literárias, que por seu teor histórico e jurídico, eram consideradas bastantes vastas e valiosas em informações historiográficas. Algumas delas foram escritas sob o pseudônimo de Philopoemen, pode-se citar como exemplo, as suas obras mais importantes: História da Província do Ceará e A Questão Religiosa.

Algumas de suas ações foram notáveis pelo tratamento de assuntos de ordem governamental no período em que foi Presidente da Assembléia Legislativa Provincial, dentre eles: criou a Lei número 502 de 22 de Dezembro de 1849: em virtude do art.19 do Ato Adicional, art. 1°, em que ficou elevada a categoria de Vila a povoação de Santa Cruz da Serra de Uruburetama, com denominação de Vila Constituinte, garantindo a Vila os direitos constitucionais da época.

Estabeleceu-se também a Resolução N° 401 de 03 de Agosto de 1848, Art.7, onde já havia presente uma preocupação com a higienização da cidade. A partir dela, ficou proibida inteiramente a criação de porcos soltos na capital, em função dos danos que podem causar a saúde dos habitantes do mesmo. Os animais que eram encontrados nas ruas acabavam sendo recolhidos pelo fiscal, ou por qualquer pessoa do povo. Esses suínos eram destinados a Câmara, ou eram entregues aos seus donos, pagando estes, 2.000 contos de réis de multa por cada um, se dentro de vinte e quatro horas de apreendidos forem eles solicitados (O CEARENSE, 06/01/1848).

Ações elaboradas pelo poder governamental com o intuito de modernizar a região e remoldar a estrutura sócio-urbana de Fortaleza. Pretendeu-se “civilizar”, adequar a população local à ordem social competitiva do sistema capitalista, sobretudo os setores populares, cujos hábitos e costumes eram tidos como rudes e arcaicos pelos agentes (as elites e o poder público) desse processo civilizatório (PONTE, 2001).
No mesmo ano, entrou em discussão o projeto N° 41, que autorizava o governo a contratar com alguma associação particular a abertura de estradas de Maranguape, Baturité e Icó, projeto sancionado pelo Presidente desta Assembléia. Além desse processo de urbanização das localidades cearenses, efetivadas durante a gestão de Tristão Alencar, ele também se destacou como Ministro da Justiça, o qual referendou o decreto que dissolveu a Constituinte da República, pelo golpe de Estado de Deodoro.

Outra ação legislativa por parte da presidência de Tristão de Alencar foi o debate acerca das crises climáticas que afetava a província naquela época. Em um resumo da ata da discussão na Assembléia, foi lido um requerimento do deputado Aires, no qual foi solicitada a nomeação de uma comissão de quatro membros para propor ações eficazes para amenizar o problemas das secas. Discussão que, depois de apoiada, deveria ser executada pela Assembléia Provincial.

Tal postura por parte da administração pública era uma tentativa de solucionar o ciclo de secas que assolava os municípios cearenses na década de oitenta. Tendo em vista que, naquela época, progressivamente, foram se tornando cada vez mais escassos os alimentos para os habitantes locais. Não havia mais criação de carneiros e cabras nas fazendas, as terras da Província do Ceará tornavam-se estéreis para a atividade agrícola e pecuária.

Porém, apesar das discussões parlamentares na casa legislativa cearense em torno do flagelo climático, não há registros posteriores em documentos e jornais da época, que registrem políticas públicas por parte do poder executivo acerca dessa problemática. Demonstrando que as práticas estatais eram insuficientes diante das graves conseqüências sociais para o povo cearense: as discussões e projetos elaborados eram logo arquivados ou recolhidos pelo governo da província (ALVES, 1982).

MANUEL TEÓFILO DE GASPAR OLIVEIRA (1852)
Manuel Teófilo Gaspar de Oliveira foi outro destacado personagem da política no Ceará Imperial. Ele exerceu a presidência da Assembléia Legislativa Provincial durante a segunda metade do século XIX, mais precisamente, no ano de 1852. Filho de Manuel Teófilo (comerciante português) e Isabel Samico Teófilo, o político local nasceu no ano de 1816, e faleceu no ano de 1859, na cidade de Baturité.

Como os demais homens que exerceram a vida pública naquela época, Manuel Teófilo era magistrado, formado em Ciências Jurídicas pela Academia de Direito de Olinda. Na área jurídica, obteve importantes funções como: Juiz Municipal de Sobral (por decreto imperial de 22 de junho de 1843); Juiz de Direito de Baturité, através de um decreto de 04 de julho de 1854. Na época em que era juiz de direito foi removido para a comarca de Cabo, local aonde veio a falecer.

A conjuntura política da época foi marcada por intensas disputas pelo poder. Como noticiava os jornais da época, o partido do Caranguejo (ala conservadora) tinha maioria na província, e que para vencer as eleições locais, se utilizou de meios reprováveis na vida eleitoral cearense. Por parte dos meios de comunicação do governo, era constante a proclamação da pureza de suas eleições. Para esse grupo, a maioria dos membros do partido representava a liberdade de seu governo, sugerindo dessa forma, que essa agremiação partidária era sustentada somente pela própria força e simpatia do povo. Defendendo-se dessa forma das acusações dos liberais, que diziam que práticas ditatoriais, corrupções e perseguições políticas eram uma constante no interior do grupo conservador.

Outro curioso fato que aconteceu no período em que Manuel Teófilo esteve à frente da Assembléia Provincial, foram os diversos conflitos internos na casa legislativa. Segundo noticiários da época, no dia 11 de outubro de 1852, ocorreu mais um episódio de tumulto na Assembléia Provincial. Nessa data, dois membros da instituição, o Deputado Franklin D´Amaral (chefe da maioria) e o Deputado Padre Sarmento, depois de trocarem insultos, um acusando o outro de ladrão e assassino, chegaram às vias de fato na secretaria. Fatos esses que demonstram que o Legislativo Estadual estava num patamar bastante perigoso naquela época, que nem mesmos nas galerias estava-se livre de algum tipo de insulto (O CEARENSE, 15/10/1852).

No início do ano de 1852, durante a gestão de Manuel Gaspar de Oliveira, a província do Ceará foi assolada por uma grave epidemia de febre amarela. Com o surgimento das chuvas, a doença se intensificou, alastrando-se pela capital e todo interior cearense. Em Aracati, por exemplo, em dezembro de 1851, foram tratadas cinqüenta e uma pessoas pelo doutor Castro Carreira, quarenta e quatro destas apresentava sintomas da doença.

Meses depois, o Partido Liberal desferiu duras críticas acerca da atuação do poder executivo (Partido Conservador) em relação à saúde pública. Para os liberais, a febre amarela continuava a matar milhares de cearenses. Cabia então exigir do governador da província, um posicionamento mais consistente acerca da problemática. Nesse sentido, a Assembléia Legislativa, que tinha seu presidente como detentor de posições políticas conservadoras, foi pressionada pelos liberais a exigir mais ações da administração pública local no combate à febre amarela.

Esse embate político-partidário entre conservadores e liberais era um reflexo da radicalização dos atores sociais pela conquista do Estado. Os defensores dos ideais republicanos, que eram oposição ao governo naquele momento, pressionaram o governador e deputados da província acerca de diversos assuntos; tais como saúde pública, segurança, execução das leis jurídicas, etc.

Desse modo, os membros da agremiação política liberal, através de seu órgão de comunicação, o jornal O Cearense, exigiram maiores esforços da Assembléia Legislativa quanto à questão da segurança pública. Para os redatores da mídia impressa, o poder legislativo devia solicitar a administração pública o aumento no número de policiais nas ruas de Fortaleza.

Além desse acirramento político entre os dois partidos, vale também ressaltar o papel da gestão de Manuel Teófilo no processo de urbanização do Ceará. Pois no início de seu mandato, o governo da província foi solicitado a desenvolver obras de reparo na estrada de Maranguape, obra a qual foi executada meses depois.

JUSTINO DOMINGUES DA SILVA (1858-1861)
Outro importante personagem da esfera política do estado do Ceará foi Justino Domingues da Silva, mais outro Deputado Provincial que passou pelo cargo de Presidente do Legislativo Provincial, nos anos de 1858 a 1861. Era filho do rico comerciante Joaquim Domingues da Silva e de Florência Maria de Jesus. Natural do Município de Sobral nasceu em 28.01.1823 e faleceu em 08.07.1907, na cidade de Fortaleza.

Esse conhecido ator do Ceará Imperial tornou-se padre no ano de 1846, pela Diocese do Maranhão. Era bacharel em Direito, formado pela Academia de Direito de Olinda-PE, no ano de 1849, mas interrompeu essa carreira por ter aceitado o pedido do pai para que seguisse a carreira eclesiástica. Eleito Deputado Provincial, exerceu mandato até 1862, sendo que, anos mais tarde, tornar-se-ia Deputado Geral na eleição de 1868, com apoio de Diogo Velho, Presidente da província do Ceara (ESTADO DO CEARA, 2006).

Além de exercer essas funções no âmbito político, o padre era um sábio conhecedor do Direito Civil e Canônico, além de possuir um profundo conhecimento da Literatura Clássica. Chegou a ser Bibliotecário durante a gestão de Freitas Henriques; foi também professor de Francês no Liceu do Ceará, no ano de 1873. Exerceu o cargo de diretor interino da Instrução Pública, por nomeação do Presidente Oliveira Maciel e Fiscal Federal da Faculdade Livre de Direito do Ceará, em que chegou a falecer.

Padre Justino, no exercício de Presidente da Assembléia Legislativa Provincial, aprovou varias resoluções que tiveram impacto para o desenvolvimento do Estado do Ceará. Uma delas foi a Resolução N° 839 de 9 de agosto de 1858, na qual foi estabelecida a categoria de cidade a Villa de Baturité, com a mesma denominação. Resolução aprovada na Assembléia e decretada pelo Doutor João Silveira de Sousa, Presidente da Província do Ceará.

Aprovou também, através da resolução N° 843 do mesmo período, artigos de postura da Câmara Municipal de Villa Viçosa em que, em seu artigo primeiro dizia que qualquer pessoa que recolher gados nos currais do município não sendo para o consumo público, pagaria por cada cabeça, vinte réis diários. Já a Resolução N° 861 de setembro de 1858, oferecia mais formalidade aos integrantes do Poder Legislativo, determinando que no início dos trabalhos da Assembléia Provincial, seja postado na frente da Igreja Matriz da capital um guarda de honra, para fazer continências ao corpo legislativo. (PROVÍNCIA DO CEARÁ, 1858).

Com objetivo de controlar os gastos públicos da Província, a Resolução N° 865 de 16 de setembro de 1859 trouxe o orçamento público que previa a receita, e fixava despesa para o ano de 1859, como explicitado em seu art 1°: a despesa provincial para o ano financeiro que corre do 1° de Janeiro ao último de dezembro de 1859 é orçada na quantia de tresentos e oitenta e dous contos trese mil e setecentos réis. Uma das mais importantes Resoluções da Assembléia Provincial foi a de número 846 de nove de agosto de 1959, em que se autorizava o Presidente da Província a despender a quantia de 20.000$000 de réis para a construção de três açudes nos municípios de Missão Velha, Pereiro e Sobral.

José Pompeu de Albuquerque Cavalcante (1878-1880)
José Pompeu de Albuquerque Cavalcante era filho de José Cavalcante e Joana Maria Cavalcante. Nascido em 10.04.1839, na cidade de Fortaleza, era engenheiro militar formado pela Escola de Guerra do Rio de Janeiro, no ano de 1865. Na vida pública desempenhou diversos tipos de cargos e atividades. Foi eleito três vezes deputado geral (1881-1884; 1885; e 1886-1889) e foi membro do Conselho de Direitos da Instrução Pública da província cearense no ano de 1865. Além disso, ele era o engenheiro e diretor das Obras Públicas em Fortaleza, deixando nesses cargos diversos trabalhos sobre temas acerca de políticas públicas, tais como o melhoramento do Porto de Fortaleza, a construção de açudes no interior e a procura de metais preciosos na região (ESTADO DO CEARA, 2006).

Como presidente da Assembléia Legislativa (1878-1880), sua principal preocupação foi fundamentar leis provinciais capazes de modernizar a região cearense de acordo com as novas exigências do sistema capitalista, e instaurar um maior controle social do Estado perante a sociedade. Nesse sentido, houve várias ações que se preocupavam com a questão dos gastos públicos, a criação de cemitérios, o controle dos índices de violência, etc.

Na capital cearense, por exemplo, a instrução pública era um dos temas de interesse da gestão de José Pompeu. Desse modo, foi elaborado e aprovado o projeto de lei número 39, de ano de 1879, o qual obrigava o poder executivo a criar um espaço na cadeia pública de Fortaleza destinado a educação dos ali encarcerados. Nesse local, deveria haver um padre incumbido de exercer o cargo de professor. Além do sistema prisional, foi criada uma escola infantil em Fortaleza. Durante a mesma época, a Assembléia emitiu um oficio o qual transmitiu a população fortalezense, um projeto de lei que regulamentava a organização de cemitérios pela Casa de Misericórdia (PROVÍNCIA DO CEARA, 16/06/1880).

Em Sobral o tema em foco era a delimitação do perímetro urbano da cidade. Foi aprovada em discussão, a lei número 8 de 1880, a qual definiu os limites urbanos deste município. Isso se sucedeu no mesmo momento em que o Poder Legislativo também homologou o código de posturas, elaborado pela Câmara Municipal sobralense. Dispositivo jurídico que possuiu a finalidade de controlar os gastos financeiros do orçamento municipal efetuados pelos políticos locais. Além disso, esse código serviu como instrumento legal para que a polícia da região pudesse manter a ordem do municipio diante de qualquer tipo de conflito social.

Nessa época, o Ceará Imperial passou por diversos tipos de conflitos sociais, instante em que as cidades do interior da província conviviam com a violência urbana. Pequenos saques em fazendas, revoltas populares e conflitos com as autoridades públicas eram ocasionados pelo acentuado pauperismo dos pequenos agricultores oriundo das crises climáticas. Diante dessa eminente anomalia social, a Assembléia Legislativa aprovou em discussão a lei número 5 de 1880, a qual instaurou um Código de Posturas na cidade de Ibiapina no combate a violência urbana. Em outras palavras, o Estado tentou obter um maior controle social sobre a sociedade civil via coerção.

Considerações Finais
O poder legislativo pretendeu modernizar a região cearense a partir do ordenamento urbano e instalar sua autonomia política em relação ao governo provincial. Esse setor governamental visava adequar a província do Ceará à ordem competitiva do sistema capitalista ao adequar os costumes tidos como arcaicos no processo civilizatório capitaneado pela produção e troca de mercadorias.

Essa postura de desenvolvimento postulada pela Assembléia Legislativa resultou na constituição de novas vilas, na higienização da região, na abertura de estradas e na determinação de perímetros urbanos. Porém, essa modernização foi muitas vezes impossibilitada em detrimento da acirrada disputa política partidária existente na província do Ceará. Em função dos conflitos entre os dois partidos da época (divididos entre liberais e conservadores), a estabilização de uma intervenção urbana foi desestruturada por motivos de privilégios de alguns políticos que foram colocados em risco.

Assim, o desenvolvimento da infra-estrutura no Ceará por parte do agente legislativo foi prejudicado pelo conservadorismo presente na mentalidade dos líderes políticos e administradores públicos locais. Ou seja, a construção de novas obras públicas e uma ação governamental de desenvolvimento ficou “refém” dos interesses particularistas/patrimoniais dos homens do poder na região cearense.


Referências Bibliográficas

ALVES, Joaquim. História das Secas (Século XVII a XIX). 2ed. Mossoró: Guimarães Duque, 1982.

ASSEMBLEIA PROVINCIAL, Jornal Correio da. Fortaleza: Typographia Patriótica de Accarsio, 1839.

BARROSO, José Liberato. Compilação das Leis Provinciais do Ceará: tomo I - 1835 a 1846. Rio de Janeiro: Typografia Universal de Laemmert, 1863.

BARROSO, Gustavo. A Margem da História. Fortaleza: Imprensa da Universidade do Ceará, 1962.

ESTADO DO CEARA, Assembléia Legislativa do. Presidentes do Poder Legislativo do Ceará: 1835-2006. 4ed. Fortaleza: INESP, 2006

GIRÃO, Raimundo. Evolução Histórica Cearense. Fortaleza: ETENE, 1985.

LEITE FILHO, Rogaciano. A História do Ceará passa por esta Rua. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 2002.

NOGUEIRA, Paulino. Presidentes do Ceará Durante a Monarquia. Fortaleza: Revista do Instituto do Ceará, v.3, 1889.

O CEARENSE, Jornal. Fortaleza: 1848 – 1852.

PROVINCIA DO CEARA, Assembléia Legislativa da. Colecção de Leis da Assembléia Legislativa da Província do Ceará. Fortaleza: Typographia Cearense, 1858.

______. Actas da Assembléia Legislativa da Província do Ceará. Fortaleza: Assembléia Legislativa da Província do Ceará, 1880.

PONTE, Sebastião Rogério. Fortaleza Belle Époque: reforma urbana e controle social (1860 – 1930). 3ed. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 2001.

SOUSA, Simone de. História do Ceará. Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 1994

O CINEMA COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO NO ENSINO DE SOCIOLOGIA

por Dennis de Oliveira Santos




Considerações Iniciais
Preocupar-se com o aprimoramento metodológico e com o aprofundamento de outras propostas pedagógicas deve ser a constante tarefa do educador rumo a finalidade de reciclar seus conhecimentos e no aperfeiçoamento de sua função pedagógica perante a sociedade. É nessa constante busca que o professor pode exercer de uma melhor forma
o seu papel na formação intelectual de seus alunos.

Nesse contexto, surge um relevante instrumento no auxílio pedagógico ao professor em suas aulas: o cinema. A “sétima arte” foi constantemente observada como um mero produto cultural. Porém, diante das possibilidades que ela apresenta quanto ao enfoque de filmes a conteúdos das disciplinas de Sociologia, ela torna-se um valioso instrumento pedagógico no aprofundamento dos assuntos discutidos em sala de aula. Desse modo, de que forma o cinema pode ser utilizado como instrumento pedagógico no ensino de Sociologia?

Procedimentos Metodológicos
Essa pesquisa foi produzida a partir de uma fundamentação metodológica baseada na Sociologia da Educação, que é a vertente da Sociologia que estuda a realidade socioeducacional, a qual oportuniza aos seus pesquisadores compreender que a educação se dá no contexto de uma sociedade que, por sua vez, é também resultante desse próprio processo educativo. Além disso, essa perspectiva também possibilita compreender e caracterizar a inter-relação ser humano/sociedade/educação à luz de diferentes teorias sociológicas (FERREIRA, 1993; MANNHEIM, 1974).
Nesse sentido, a Sociologia da Educação integrada a discussões teóricas de especialistas no âmbito da didática (DEWEY, 1966; FREIRE, 2007), constitui-se um cabedal metodológico-teórico que auxilie a discutir as concepções didáticas que propiciem o desenvolvimento da prática docente no que condiz aos procedimentos e posturas efetuadas por parte do educador. Além disso, foram utilizadas reflexões teóricas (TURNER, 1997; MODRO, 2006; DUARTE, 2002) de especialistas acerca do uso do cinema na prática educacional. Teorias educacionais e acerca do uso do cinema, as quais foram aplicadas a um estudo de caso. O local escolhido para aplicar essas experiências do uso do cinema em sala de aula pelo autor da pesquisa foi em sua disciplina de Introdução à Sociologia do curso Sociologia e Política da UNIFOR (UNIVERSIDADE DE FORTALEZA, 2007).

Concepções Didáticas
As concepções didáticas que podem ser relevantes para se efetivar uma reflexão acerca das práticas docentes anteriormente descritas são os métodos dos educadores Jonh Dewey e Paulo Freire. A partir do enfoque pedagógico que ambos atribuíram ao sentido da educação: a importância da experiência no ensino (Dewey) e a formação do espírito crítico na educação (Freire), situar de forma crítica alguns elementos de superação nas minhas práticas didáticas.

Dewey via a educação distintamente da forma tradicional. Para ele, o saber adquirido pelo aluno na escola poderia ser interligado em sua vida como cidadão. Quer dizer, a educação centra-se no desenvolvimento da capacidade de raciocínio e formulação do espírito crítico do educando ao invés de simples memorização das lições educacionais.
O educador norte-americano argumentava que enquanto alteramos nosso relacionamento com nosso ambiente sofremos alterações em decorrência dessas experiências. Isso equivale afirmar que o conhecimento é adquirido e expandido na medida em que nossas experiências passadas são utilizadas na elaboração de novos e significativos problemas. Nesse sentido, a educação é uma reconstrução da experiência, momento de aplicar experiências anteriores a situações novas.

Nesse contexto, a tarefa da escola é propiciar um ambiente no qual a aprendizagem se dê por vias de experimentos, de tal forma, que correspondam aos interesses dos alunos. Fazer que o aprendizado tenha significado para quem está sendo educado, que envolva-o ao mesmo tempo em que seja desafiado a novos questionamentos. Assim, o papel do educador é desenvolver no aluno a sua capacidade de interpretar a experiência, o que implica na construção de hipóteses que serão testadas por meio de novos experimentos - as experiências subseqüentes.

Desse modo, a educação consiste no enfoque do desenvolvimento de habilidades cognitivas ao invés da mera transmissão do conhecimento. Habilidades adquiridas que aumentarão a capacidade de raciocínio crítico do aluno, contribuindo para o desenvolvimento de sua autonomia. Vejamos o que o próprio autor comenta a respeito:

A educação é a reconstrução ou reorganização da experiência que acrescenta significado a esta e aumenta a habilidade para dirigir a experiência subsequente. (...) A função da escola não é transportar os adolescentes de um ambiente ativo para o outro de um estudo inerte dos registros daquilo que outros homens aprenderam, e sim levá-los de um ambiente de atividades selecionadas, tendo vista servir de guias para o aprendizado (DEWEY, 1966, p. 117-301).

Seu método didático de ensino caracteriza-se pelo “aprender fazendo”, que seleciona uma situação vivida pelo aluno, que seja desafiante e que careça de uma solução para um problema prático. Dessa forma, o professor deve expor os conteúdos escolares a partir de problemas ou questões, ao invés de antemão dá respostas ou soluções prontas em sala de aula.

Nesse contexto, Dewey propõe um procedimento fortemente amparado no método científico, em que existem cinco passos para resolução de problemas: primeiro, ter consciência do problema; segundo, defini-lo; terceiro, proposição de diversas hipóteses para solucioná-lo por parte dos alunos; quarto, examinar as conseqüências da cada hipótese a luz de experiências passadas; e quinto, testar a solução mais provável.

A junção desses cinco procedimentos substitui as definições ou conceitos elaborados apenas pelo professor. Deve-se fazer com que o aluno raciocine e elabore os próprios conceitos para depois confrontar com o conhecimento sistematizado. O ensino deve se basear na experiência do educando. Afirmações as quais são amparadas teoricamente pelo maior discípulo brasileiro do pensador norte-americano:

O conhecimento, pois, é o resultado de um processo de indagação. E a marcha deste processo de pesquisa é o que Dewey chama de lógica. Vale dizer: lógica é o processo do pensamento reflexivo; “conhecimento”, é o resultado deste processo; o “já conhecido” é o “material”, que usamos no operar a investigação ou pesquisa. (...) Para Dewey as próprias “formas” lógicas se originam de e no processo de indagação, inquérito ou investigação. Não pré-existem ao processo da indagação; mas, formam-se no e pelo processo mesmo da indagação, e são os instrumentos de direção e controle desse processo. (...) No complexo estágio humano, a deliberada formulação de problemas se transforma em um objeto de atividade em si mesma e, deste modo, a investigação em uma atividade permanente e, teoricamente, indefinida (TEIXEIRA, 04/04/2007, p. 04-13).

Para Paulo Freire a educação possui o papel transformador da realidade social dos educados, instante em que o ensino possui uma concepção crítica, capaz de atuar no desenvolvimento intelectual dos sujeitos e libertá-los rumo a condição de serem sujeitos da história ao invés de objetos.

Desse modo, o ensino, “a educação, como prática da liberdade, é um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade” (FREIRE, 06/04/2007, p. 1). Nesse sentido, é atribuído a educação a finalidade de possibilitar ao homem refletir sobre seu contexto sócio-histórico, abrindo espaço para sua conscientização e libertação das “amarras impostas” por suas relações sociais: ser o sujeito consciente de sua própria história. Fundamentação pedagógica exposta pelo autor:

É preciso que a educação esteja – em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos – adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história. (...) O homem não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da realidade, se não é auxiliado a tornar consciência da realidade e de sua própria capacidade de transformá-la (FREIRE, 06/04/2007, p. 16-17).

Baseado numa perspectiva dialética, o educador brasileiro estabelece seu método de ensino como forma de análise da situação concreta e existencial dos indivíduos. Seu movimento dialético exige que se passe do abstrato ao concreto, da parte ao todo, para voltar depois as partes; fazendo que o sujeito se reconheça no objeto como uma situação na qual se encontra com outras pessoas.

Há então a aplicação do método a partir de cinco fases: primeiro, a “descoberta do universo vocabular”, onde se levanta o universo vocabular do grupo que está sendo educado. É um momento em que ocorrem interações de aproximação e conhecimento mútuo (professor-aluno), para que o educador posteriormente se utilize da linguagem dos membros do grupo para tornar suas aulas inseridas na visão de mundo desses sujeitos.

O segundo passo é a seleção dessas palavras, a qual segue uma seqüência gradativa dos mais simples para os complexos, tudo inserido na realidade social dos educados. Já no terceiro momento há a criação de situações existenciais típicas do grupo com o qual se trabalha. Tratam-se de situações inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas para a análise crítica consciente de problemas locais dos sujeitos. No quarto momento se cria fichas-roteiro que nortearão/coordenarão os debates nas aulas. E na última fase se dá a criação de fichas “... nas quais aparecem as famílias fonéticas correspondentes as palavras geradoras” (FREIRE, 06/04/2007, p. 22).

O Cinema como Instrumento Pedagógico
Diante dessas fundamentações teóricas, as quais situam a tarefa do educador como valorização da experiência e a fomentação do espírito critico no aluno, o cinema surge como um instrumento a trabalhar tais aspectos na atividade educacional. Porém, de que forma deve ser utilizado o cinema em sala de aula?

O cinema utilizado de uma forma adequada e especificado de um modo claro quais os objetivos a serem alcançados com o filme, encontra-se então uma fonte inesgotável de significados para as pessoas em nossa cultura. Através desse instrumento é possível promover um acesso mais fácil a determinados assuntos concernentes a Sociologia. O que equivale afirmar que os filmes se prestam a inúmeras leituras e análises de acordo com o seu contexto (TURNER, 1997).

O material cinematográfico é uma relevante fonte de informações para se reconstruir através de imagens e sons uma dada realidade social. Tendo em vista que se deve propor um recorte de determinados aspectos a serem retratados, focando uma trama que faz parte de seu enredo histórico o conteúdo o qual leva os alunos a assistirem esse filme. Esses procedimentos por sua vez enriquecem as diferentes visões que cada aluno em sala de aula possa ter: acrescenta novas explicações sobre o tema em debate no filme, alerta para novos detalhes a serem captados, ilustra questões da realidade social da temática em discussão, etc (DUARTE, 2002).
Porém, alguns cuidados na utilização dos filmes devem ser levados em conta. O docente deve-se atentar para o fato de que o vídeo pode e deve ser utilizado como suporte as suas aulas, mas de forma racional, estipulando critérios e nunca utilizando o material cinematográfico como substituto das aulas. Dessa forma, o cinema é tido como um recurso auxiliar, o qual complementa o que é ministrado aos educados. Nesse sentido, deve-se atentar para a escolha do filme:

Um dos maiores problemas na escolha de um filme é diretamente relacionado à censura do mesmo. Por vezes alguma cena que contenha nudez, violência, palavras de baixo calão e coisas do gênero podem gerar transtornos significativos caso não haja um trabalho adequado de preparo em relação ao filme. (...) Assim, é necessário, sempre, assistir anteriormente ao filme, selecionar o que será trabalhado, e, previamente alertar e preparar o público para o que será assistido (MODRO, 2006, p. 12).

A questão acerca da veracidade das obras cinematográficas é outro assunto que deve ser refletido por parte do docente. Sempre deverá ser ressaltado ao público que os filmes são apenas uma representação do real, momento em que a realidade social é transposta para a arte a partir de determinados pontos de vista; sendo uma representação parcial do real. Ou seja, o cinema é uma fonte de conhecimento representativa, para a partir daí ser analisado o conteúdo de seu bojo. Os filmes nunca devem ser considerados como representantes fidedignos dos eventos que retratam.
Deve-se também adequar o filme a proposta desejada pelo professor, instante em que haverá a exposição de quais objetivos são desejados e como se espera alcança-los. Além disso, o educador estará atento na escolha dos filmes, principalmente a temas polêmicos que possam gerar controvérsias em relação a valores morais ou religiosos. Discuti-los não equivale a defender um ponto de vista específico, mas expor diferentes formas de pensar (DUARTE, 2002).

Procedimentos pedagógicos que possuem como objetivo trabalhar o cinema de forma coerente e adequado a temas específicos, sempre voltados para a apresentação ou complementação de conteúdos ministrados pelo professor. Utilizando os filmes de forma delimitada, ou seja, interligando o conteúdo cinematográfico com as temáticas da disciplina, alcança-se importantes resultados rumo a horizontalização das discussões dos assuntos abordados em sala de aula.
Procedendo dessa forma, cada filme apresentará múltiplas possibilidades junto à criatividade e habilidade do educador em conduzir o processo. Tornando o uso do cinema uma experiência riquíssima aos alunos, principalmente quando se considera as possibilidades de se estabelecer uma relação do conteúdo do filme com temas das disciplinas ministradas pelo professor.

Considerações Finais
A partir das reflexões teóricas discutidas e das observações em estudo de caso, percebe-se que o cinema é um eficaz instrumento pedagógico no ensino de conteúdos concernentes a ciência sociológica. Utilizar filmes como recurso auxiliar é uma relevante forma de enriquecer a aula, cabendo ao professor definir qual o melhor caminho para que seus objetivos sejam alcançados plenamente.

Constata-se que o uso do vídeo pode ser uma constante na prática docente desde que se atente para alguns cuidados e se estabeleça de forma objetiva quais as finalidades programáticas de ensino que serão alcançadas com esse tipo de atividade junto aos alunos. Trabalhando com esse recurso em sala de aula, suscita por parte do professor a possibilidade de aguçar um maior olhar crítico dos alunos em relação aos temas presentes nos filmes. O cinema surge assim como uma reconstrução da realidade histórica, tornando-se um importante instrumento na contextualização dos assuntos em pauta em sala de aula.

Referências Bibliográficas

DEWEY, John. Democracy and Education. Nova York: Macmillan, 1966.

DUARTE, Rosália. Cinema & Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

FERREIRA, Roberto Martins. Sociologia da Educação. São Paulo: Moderna, 1993

FREIRE, Paulo. Alfabetização e Conscientização. Disponível em: . Acesso em: 6 de Abril de 2007.

MANNHEIM, Karl. Introdução a Sociologia da Educação. 3ed. São Paulo: Cultrix, 1974.

MODRO, Nielson Ribeiro. Cineducação 2: usando o cinema na sala de aula. Joinville: Univille, 2006.

TEIXEIRA, Anísio. Bases da Teoria Lógica de Dewey. Disponível em . Acesso em: 4 de Abril de 2007.

TURNER, Graeme. Cinema como Prática Social. São Paulo: Summus, 1997.

UNIVERSIDADE DE FORTALEZA. Curso de Sociologia e Política. Disponível em: . Acesso em: 08 de Abril de 2007.