O Conformismo da Opinião Pública
Diante das Instituições Políticas
por Dennis de Oliveira Santos
Por que a
população brasileira não se mobiliza (como no período Dilma) contra o governo
Temer? O que fez cessar os panelaços e as passeatas em verde amarelo contra um
chefe de Estado que possui sérias evidências de corrupção, retração de
programas sociais e que não consegue resolver a crise econômica que o país está
envolvido?
Na
Europa e nos Estados Unidos o processo de não existir grandes mobilizações
populares contra governantes privatistas de espaços públicos também possui
características semelhantes. Nos dois eixos políticos o que se observa é uma
retórica de condenação aos excluídos (fechamento das fronteiras para coibir a
entrada de imigrantes), desmonte de acordos internacionais para a integração
entre os países (caso do Brexit na União Europeia) e desmonte das políticas
públicas do Estado de Bem-Estar Social (a tentativa de Trump de acabar com o
sistema público de saúde estadunidense).
Para
além dos contornos regionais que influenciam nesse processo, no caso do Brasil,
o sentimento da classe média de não pertencimento ao grupo dos explorados e sua
falaciosa/seletiva retórica de combate a corrupção, existe globalmente uma
cosmovisão social que impede os indivíduos de se enxergarem como potenciais
atores coletivos de transformações fundamentais no meio em que vivem. Essa
concepção está alicerçada no individualismo exacerbado construída em tempos de
recessão econômica neoliberais, a qual impede o homem de se colocar como
portador de direitos e sujeito capaz de concretizar mudanças sociais.
A
concepção do Estado mínimo (GENTILI, 1995) não apenas enfraqueceu o poder de
governança no combate às desigualdades sociais, mas também corroeu a atuação
nos espaços públicos. Isso porque a superespecialização nas relações do
trabalho advindas do taylorismo e da flexibilização (SENNETT, 1988)
individualizou tanto a mentalidade dos trabalhadores, que os mesmos só
conseguem pensar em atividades ou projetos a curto prazo. A responsabilidade com o futuro, os grandes projetos
para o destino da nação ou as percepções ideológicas para a reconstrução da
ordem social são temáticas desprovidas de interesse ou sentido para quem só
está preocupado com o aqui e agora e se o mesmo vai se manter no mercado de
trabalho.
Isso
se reflete profundamente na política quando essa esfera da atividade humana
passa a ser vista como o espaço do “fracasso imutável” por parte da classe
trabalhadora. Pois após a queda do Muro de Berlim (HOBSBAWN, 1995) e no
conseguinte triunfo da ideologia neoliberal, gestou uma sociabilidade em que os
afetos e as relações interpessoais se sobrepõem aos grandes ideais políticos ou
filosóficos. A individualidade, a particularidade e a experiência emocional dos
indivíduos geram um ambiente em que se abre mão de um futuro racionalmente
construído em troca da concretização dos desejos mais imediatistas. É a vida da
sociedade pós-moderna (BAUMAN, 1998), a qual desacreditada em suas instituições
reguladoras e sem uma ideologia sólida que se contraponha ao mal-estar vivenciado
cotidianamente, permanece num certo conformismo.
Nesse
tipo de mentalidade, o trabalhador está sempre passível de sofrer com as
incertezas do mercado de trabalho e o alarmante aumento dos índices de
desemprego. Tais elementos geram nesse sujeito uma sensação de medo e
insegurança. Sendo assim, o foco coletivo para resolução dos problemas sociais
é perdido – desmorona-se o sentimento de coletividade diante desse extremo
individualismo, as pessoas não conseguem mais conceber que organizações como
sindicatos e partidos políticos consigam mais organizar a ordem social e todas
as mazelas sociais passam a ser vistas como impasses de cunho individual. Assim
as relações humanas são marcadas pela efemeridade, pressa, brevidade; valores esses
reforçados pelas comunicações eletrônicas.
O
declínio da coisa pública (BOURDIEU, 2009) gera a sensação no cidadão de que
ele é repelido para fora do Estado (que no fundo só exige desse sujeito o
cumprimento de suas obrigações fiscais com as autoridades públicas independente
da melhoria da qualidade de vida do mesmo). Dessa forma, o trabalhador trata as
instituições políticas como instrumento alheio a concretização dos seus
interesses e não desenvolve nenhum entusiasmo quando movimentos sociais tentam
ir contra esse tipo de mentalidade hegemônica na opinião pública.
As
mudanças e inseguranças no mundo contemporâneo advindas do capitalismo flexível
gerou um medo e conformismo entre os trabalhadores – sentimento de fracasso
que dificulta que esse setor social se organize aos moldes clássicos do
conflito de classes e lute por melhoria em sua qualidade de vida.
A lógica de
resolver isoladamente problemas a curto prazo e a necessidade de constantemente
se adaptar as mudanças do mercado desmontou de forma significativa a mobilização
da opinião pública nos espaços institucionais. Nesse contexto, mesmo o sujeito
percebendo que sua condição econômica é empobrecida diariamente pelas ações do
Poder Público, o mesmo tende a se conformar com a situação – ele imagina o “fim
da história” porque não há como ser diferente. Sem enxergar uma ideologia que
renove o seu folego coletivo, cético diante das instituições sociais e
atomizado na resolução dos seus problemas – o homem pós-moderno tende a “naturalizar”
o fato de que multinacionais enriqueçam sozinhas enquanto a maioria da
população cada vez mais sofre com a desigualdade política/econômica.
Referencias Bibliográficas:
BAUMAN, Zigmunt. O mal estar da pós-modernidade. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1998
BOURDIEU, Pierre. Contrafogos 2: por Um Movimento Social
Europeu. São Paulo: Zahar, 2009.
HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos - o breve século XX.
10ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
GENTILI (org.), Pablo. Pós-neoliberalismo: as políticas
sociais e o estado democrático. 4ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
SENNETT, Richard. O Declínio do Homem Público: as
tiranias da intimidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.