domingo, 25 de novembro de 2018

O Povo Brasileiro de Darcy Ribeiro - Matriz Tupi


O Povo Brasileiro de Darcy Ribeiro - Matriz Tupi

(Análise resumida da obra do PAS à luz das teorias sociológicas)

Dennis de Oliveira Santos


Na obra O Povo Brasileiro, o antropólogo Darcy Ribeiro tem como preocupação central compreender de que forma os três grupos étnicos originários (negros, índios e brancos) contribuíram para a formação social do país. A partir de uma trajetória histórica e das singularidades culturais alicerçadas na região, a obra aborda a formação sócio histórica do povo brasileiro em suas amplas manifestações. 

No trecho do livro em que o autor oferece atenção aos povos indígenas, ele traz elementos empíricos para demonstrar que o principal fator indentitário da cultura brasileira é a miscigenação. O fator preponderante que forma a cultura local e nos diferencia de todos as outras nacionalidades é a nossa capacidade de gerar uma sociedade que é fruto das relações culturais entre os povos que ocuparam o território ao longo do processo de colonização.  

A partir de uma união entre europeus, africanos e índios na esfera cultural se deu a gestação de uma nova etnia, a qual foi sendo unificada através das suas línguas e costumes. Das línguas utilizadas no período colonial (tupi de origem indígena e o português lusitano dos colonizadores) que se mesclaram e hoje se tem um português local, muito distinto do falado em Portugal e com termos próprios. O costume de banhar várias vezes ao dia trazido pelos índios, a culinária negra materializada em pratos como o acarajé e a forma patrimonial portuguesa de não estabelecer limites entre as esferas públicas e privadas nas relações sociais. O Brasil é um somatório da contribuição cultural das três matrizes étnicas que o formou ao longo dos séculos, uma nação multicultural.

Nesse ponto, a análise de escritor está alinhada com os estudos de outro importante cientista social, o pernambucano Gilberto Freire. Esse teórico em sua obra Casa Grande e Senzala também afirma que a singularidade brasileira foi o encontro intercultural nos trópicos durante o processo de colonização. Ao priorizar a participação da matriz africana em seus estudos, o sociólogo demonstra que os relacionamentos inter-raciais e a junção de manifestações sociais na culinária, na arquitetura e na religião produziram um sincretismo que teve como fruto uma cultura híbrida no Brasil, a qual não pode ser dissociada da intensa mistura de nossos antepassados. 

Darcy Ribeiro também afirma que antes da chegava dos colonizadores predominava uma humanidade diferente na região - a forma dos povos indígenas de serem autossuficientes e de terem um profundo conhecimento da natureza ao seu redor. Ocupando as diversas regiões do território nacional, os índios conheciam em cada detalhe as matas e os animais. Eles produziam os seus instrumentos de trabalho a partir da coleta de materiais nas matas e todo o seu alimento também era obtido nesses locais. Por estarem bem ambientados em seus ecossistemas, os ameríndios plantavam, colhiam, utilizavam plantas medicinais e caçavam de uma forma que suas vidas eram materialmente supridas.  

Na organização social indígena, o pesquisador ressalta que esse povo possuía uma certa liberdade sexual: aceitava a poligamia, a homossexualidade e tanto mulheres como homens podiam se separar dos seus companheiros. Existia uma divisão de tarefas entre os adultos enquanto os meninos eram preparados para se tornarem caçadores guerreiros. Dados que se opõem ao modo de vida dos portugueses, o qual era calcado numa postura patriarcal em que os papéis sociais femininos eram limitados e existiam uma série de restrições às práticas sexuais. 

Entre os Tupinambás, uma das comunidades indígenas existentes durante o Brasil Colônia, o ato da guerra era uma atitude bastante valorizada. Isso se deve a concepção de que os povos conquistados por eles durante uma batalha poderiam ser aprisionados e feitos de escravos. Nesse sentido, os indivíduos vencidos eram sacrificados e comidos num ritual mítico que o legitimava - a necessidade de espantar a violência da comunidade através do sacrifício de membros de outros grupos. 

Essa prática cultural também deve ser compreendida como uma forma de organizar a comunidade e lhe manter viva através de uma certa ordem. Essa ação pode ser compreendida à luz das teorias sociológicas clássicas de Emile Durkheim - tal postura se soma a um conjunto de regras e comportamentos que tem a finalidade de reger a sociedade, gerar modelos de comportamento que possam integrar os indivíduos nos mesmos valores e assim manter a comunidade equilibrada nos mesmos objetivos. Aspectos importantes para a manutenção de organizações coletivas que tem como finalidade alcançar uma coesão social.

É também necessário ressaltar a questão de o que define um povo não é a demarcação territorial ou o seu material genético transmitido entre gerações, mas sim um conjunto de características culturais que faz dele um grupo identitário. Diante dessa lógica, o autor abre espaço em sua obra para a discussão do conceito de etnia – a concepção associada à diversidade cultural, elemento mais apropriado para identificar os diferentes grupos humanos.

Assim, a partir dos elementos históricos discutidos na obra, a conclusão a partir da descrição do modo de vida indígena é de que esse povo contribuiu intensamente para a formação sociocultural do pais. A junção das três matrizes étnicas é que forma o povo brasileiro, o qual é diferente de todas as outras nacionalidades, marcado por uma hibridez de práticas e valores culturais genuínos.