sábado, 16 de setembro de 2017

A Caixa de Pandora Brasil 2018



A Caixa de Pandora Brasil 2018

por Dennis de Oliveira Santos

Relações promíscuas entre Estado e corporações empresarias, os dramas regionais sendo alargados, uma justiça partidarizada, perda de direitos sociais, a desigualdade se impondo como uma pluralidade intrínseca, um nefasto sistema partidário de coalizão que tende a se perpetuar e um governo federal amplamente denunciando que balança mas não cai dado o auxílio dos outros poderes - essa é a caixa de pandora  aberta e que sangra diante do descontentamento popular (nem tão "descontente" assim tamanho o imobilismo atual nas ruas). Já que a esperança é a última que falece (e já está em vias terminais nas paragens políticas daqui), a questão inevitável para 2018 é: algum dos prováveis presidenciáveis apresenta uma agenda/projeto para pensar o Brasil daqui pra frente?

Essa temerosa indagação joga nossos afoitos olhares para um centro político esvaziado de propostas sólidas/inovadores ou colide nossos ânimos com as perdas sociais irreparáveis (fruto das reformas) que dificilmente qualquer presidente eleito poderá reverter. Não há uma ideia inovadora, um projeto que de fato combata o maior problema da nação (a desigualdade) - nossos prováveis candidatos estão muito aquém dessa possibilidade. As cantigas de sempre lavam a roupa do corpo político. Os cantos são tão repetitivos, tão capengas, que a opinião pública anda acabrunhada, desbaratinada.

Nada de projeções nacional-desenvolvimentistas, retomada do crescimento industrial/ consumo interno, de diminuir a dependência do capital estrangeiro - que Celso Furtado e Florestan Fernandes não se sintam tão incomodados em seus caixões diante desse sepulcro neoliberal, dessa verborragia política dominada pelos gritos de "Estado mínimo", "privatiza tudo" e etc. Diante da entrega do nosso patrimônio as grandes potencias mundiais por parte de Temer, instante em que nossas cadeias produtivas estão se internacionalizando em detrimento da perda da autonomia nacional, o cenário é desolador no que concerne uma saída para a crise existente.

Seguindo a retórica neoliberal e usando elegantes camisas Ralph Laren, João Dória deseja vender a ideia de uma nova gestão que deseja "acelerar o país". Mas para além de sua midiática exposição em selfies e vídeos de youtube, o que vemos é um prefeito que privatiza praças públicas em São Paulo para gerar capital para empresas amigas. Um administrador que além de cortar programas sociais que atendia populações carentes na área da educação e saúde, teve a cruel coragem de jogar água gelada em moradores de rua num dia extremamente frio na cidade paulistana. O corte de merenda para crianças ou a praça de guerra montada contra dependentes químicos demonstra que o empresário é apenas um Temer versão 2.0 no trato das questões sociais.

No mesmo lado do palavreado hayekiano, temos o vociferador de preconceitos e potencializador da cegueira ideológica que paira sobre a opinião pública, o conservador Jair Bolsonaro. Entretanto, ao contrário do empresário paulistano, o "inquisidor" de minorias vai aderir ao discurso econômico vigente por mera indução dos seus apoiadores e mantenedores de campanha - já que o mesmo confessou que pouco ou quase nada sabe a respeito de temas econômicos. É o político que defende um nacionalismo raso, pífio, de verborragia contra as esquerdas, mas que teve um silencio intencional quando as riquezas da Petrobras foram leiloadas para o capital estrangeiro. Quem cala consente.

Do outro lado do ringue político temos o que Brizola definiu muito bem: a esquerda com a qual a direita goza. Apesar do desgaste da imagem do PT em função dos seus (des)caminhos no poder, Lula (caso não seja preso por discutíveis ações jurídicas) é forte candidato a presidente, o que é decorrente de um típico líder carismático e a memória  dos programas sociais gestados pelo ex-presidente. O partido em questão e seu líder parece não fazer uma autocrítica necessária e pelo visto vai repetir os mesmos erros que levou a sua derrocada durante o mando de Dilma. Isso porque Luís Inácio volta a cometer os mesmos erros da política de alianças que derrubou esta agremiação - buscar apoio dos velhos caciques do PMDB. Assim como foi a política de alianças no período Dilma, a qual gerou a cobra dentro do próprio ninho que depois a engoliu (Eduardo Cunha), Lula em sua caravana no Nordeste insistiu no erro em buscar o neocoronel alagoano Renan Calheiros como apoio político.

De que forma Lula vai retomar as políticas de redistribuição de renda que efetivou com o apoio dos mandachuvas do PMDB que já provaram que a qualquer momento podem se vender para forças contrárias? Como o PT vai defender essa situação em período eleitoral perante a opinião pública diante de sua constante oposição no período pós-golpe ao partido de Temer? E o mais alarmante: como vai conseguir manter uma unidade de interesses no Legislativo diante do constante racha interno do PMDB e a oposição que muitos parlamentares farão contra tudo que não é privatizar a coisa pública? De um Lula política de alianças renovado, o qual anda elogiando José Sarney e Emilio Odebrecht, é difícil pensar um campo político em que as elites nacionais não irão influenciar negativamente (e partir dos seus interesses privatistas) no provável governo petista que defenda o aumento de programas sociais.

Alguns elegem como a luz no fim do túnel o cearense Ciro Gomes. Com a postura do nordestino valente, do cabra macho e com uma certa petulância, o político se coloca como o nome ideal para "salvar" o país - uma retórica de líder messiânico que deixaria boquiaberto o genial Max Weber. O apresentador de soluções infalíveis até apresenta ideias inovadoras que podem auxiliar no desenvolvimento nacional: diminuir a dependência dos produtos estrangeiros, taxação de impostos diferenciado sobre fortunas e etc. Entretanto, o ex-ministro não explica detalhadamente, não desenvolve uma estratégia clara de como iria alcançar tais medidas políticas.

De que forma, por exemplo, Ciro iria conseguir impor a taxação sobre fortunas ou parar o processo de privatização diante de um Legislativo hiperconservador economicamente e uma mídia corporativista que iria destruir sua imagem diante da opinião pública? No período pós-Dilma uma coisa que ficou clara foi o fortalecimento das elites tanto no poder como também no discurso anti-esquerdismo hegemônico entre alguns setores da população. Ciro discursa, entra em embate com opositores, mas em nenhum momento detalha como um governo que se coloca como progressista irá conseguir vencer as inúmeras barreiras que serão colocadas por uma elite que se revigorou no poder.

Além disso, o ex-governador do Ceará está mais para centrão do que esquerda. O que dizer de uma cria política de Tasso Jereissati, que já foi do PDS, PMDB, PPS e agora no PDT? Esse pula galho partidário em busca do poder é o mesmo que se observa em Marina Silva - presidenciável que defende a preservação  do meio ambiente, mas tem sua campanha apoiada pelo dinheiro de empresas como o Banco Itaú. Soma-se a essa contexto, o fato da acreana emitir um discurso dúbio, que constantemente é alterado diante das situações - ela nunca deixou claro que se opõe ao discurso neoliberal hegemônico no país.


Enfim, temos uma alta noite de desalento que se estende sobre o país, um vácuo, uma ausência de novos horizontes que poderiam impor políticas públicas de redistribuição de renda e remontar a autonomia nacional. Apesar do desanimo que se abate sobre nossas cabeças, o momento é do povo se reorganizar e pressionar tais presidenciáveis a apresentarem propostas que pragmaticamente mudem os rumos do país. Que sejamos pessimistas na razão para encontrar o otimismo na vontade.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017


A Insistência da Política de Alianças de Lula com o PMDB


por Dennis de Oliveira Santos


Lula volta a cometer os mesmos erros que levou o PT a sua derrota no poder e até mesmo a uma crise ética - buscar apoio dos velhos caciques do PMDB. Assim como foi a política de alianças no período Dilma, a qual gerou a cobra dentro do próprio ninho que depois a engoliu (Eduardo Cunha), o líder petista em sua caravana no Nordeste insiste no erro em buscar o neocoronel alagoano Renan Calheiros como apoio político (sem contar o elogio feito a Sarney).

Assim, ou o PT rompe com essa base que o levou aos frangalhos ou será aquilo que foi muito bem definido por Brizola - a esquerda com a qual a direita goza. É hora do partido voltar as suas raízes e procurar base política nos movimentos sociais e camadas populares em geral (como fazia bem até o início da década de 1990). Agindo contrário a isso, corre o risco de ser mais um partido "aburguesado" e emaranhado nas burocracias pífias do poder.

sábado, 19 de agosto de 2017



O Conformismo da Opinião Pública Diante das Instituições Políticas

por Dennis de Oliveira Santos   

Por que a população brasileira não se mobiliza (como no período Dilma) contra o governo Temer? O que fez cessar os panelaços e as passeatas em verde amarelo contra um chefe de Estado que possui sérias evidências de corrupção, retração de programas sociais e que não consegue resolver a crise econômica que o país está envolvido?

Na Europa e nos Estados Unidos o processo de não existir grandes mobilizações populares contra governantes privatistas de espaços públicos também possui características semelhantes. Nos dois eixos políticos o que se observa é uma retórica de condenação aos excluídos (fechamento das fronteiras para coibir a entrada de imigrantes), desmonte de acordos internacionais para a integração entre os países (caso do Brexit na União Europeia) e desmonte das políticas públicas do Estado de Bem-Estar Social (a tentativa de Trump de acabar com o sistema público de saúde estadunidense).

Para além dos contornos regionais que influenciam nesse processo, no caso do Brasil, o sentimento da classe média de não pertencimento ao grupo dos explorados e sua falaciosa/seletiva retórica de combate a corrupção, existe globalmente uma cosmovisão social que impede os indivíduos de se enxergarem como potenciais atores coletivos de transformações fundamentais no meio em que vivem. Essa concepção está alicerçada no individualismo exacerbado construída em tempos de recessão econômica neoliberais, a qual impede o homem de se colocar como portador de direitos e sujeito capaz de concretizar mudanças sociais.
               
A concepção do Estado mínimo (GENTILI, 1995) não apenas enfraqueceu o poder de governança no combate às desigualdades sociais, mas também corroeu a atuação nos espaços públicos. Isso porque a superespecialização nas relações do trabalho advindas do taylorismo e da flexibilização (SENNETT, 1988) individualizou tanto a mentalidade dos trabalhadores, que os mesmos só conseguem pensar em atividades ou projetos a curto prazo.  A responsabilidade com o futuro, os grandes projetos para o destino da nação ou as percepções ideológicas para a reconstrução da ordem social são temáticas desprovidas de interesse ou sentido para quem só está preocupado com o aqui e agora e se o mesmo vai se manter no mercado de trabalho.
               
Isso se reflete profundamente na política quando essa esfera da atividade humana passa a ser vista como o espaço do “fracasso imutável” por parte da classe trabalhadora. Pois após a queda do Muro de Berlim (HOBSBAWN, 1995) e no conseguinte triunfo da ideologia neoliberal, gestou uma sociabilidade em que os afetos e as relações interpessoais se sobrepõem aos grandes ideais políticos ou filosóficos. A individualidade, a particularidade e a experiência emocional dos indivíduos geram um ambiente em que se abre mão de um futuro racionalmente construído em troca da concretização dos desejos mais imediatistas. É a vida da sociedade pós-moderna (BAUMAN, 1998), a qual desacreditada em suas instituições reguladoras e sem uma ideologia sólida que se contraponha ao mal-estar vivenciado cotidianamente, permanece num certo conformismo.
               
Nesse tipo de mentalidade, o trabalhador está sempre passível de sofrer com as incertezas do mercado de trabalho e o alarmante aumento dos índices de desemprego. Tais elementos geram nesse sujeito uma sensação de medo e insegurança. Sendo assim, o foco coletivo para resolução dos problemas sociais é perdido – desmorona-se o sentimento de coletividade diante desse extremo individualismo, as pessoas não conseguem mais conceber que organizações como sindicatos e partidos políticos consigam mais organizar a ordem social e todas as mazelas sociais passam a ser vistas como impasses de cunho individual. Assim as relações humanas são marcadas pela efemeridade, pressa, brevidade; valores esses reforçados pelas comunicações eletrônicas.
               
O declínio da coisa pública (BOURDIEU, 2009) gera a sensação no cidadão de que ele é repelido para fora do Estado (que no fundo só exige desse sujeito o cumprimento de suas obrigações fiscais com as autoridades públicas independente da melhoria da qualidade de vida do mesmo). Dessa forma, o trabalhador trata as instituições políticas como instrumento alheio a concretização dos seus interesses e não desenvolve nenhum entusiasmo quando movimentos sociais tentam ir contra esse tipo de mentalidade hegemônica na opinião pública.  
               
As mudanças e inseguranças no mundo contemporâneo advindas do capitalismo flexível gerou um medo e conformismo entre os trabalhadores – sentimento de fracasso que dificulta que esse setor social se organize aos moldes clássicos do conflito de classes e lute por melhoria em sua qualidade de vida.

A lógica de resolver isoladamente problemas a curto prazo e a necessidade de constantemente se adaptar as mudanças do mercado desmontou de forma significativa a mobilização da opinião pública nos espaços institucionais. Nesse contexto, mesmo o sujeito percebendo que sua condição econômica é empobrecida diariamente pelas ações do Poder Público, o mesmo tende a se conformar com a situação – ele imagina o “fim da história” porque não há como ser diferente. Sem enxergar uma ideologia que renove o seu folego coletivo, cético diante das instituições sociais e atomizado na resolução dos seus problemas – o homem pós-moderno tende a “naturalizar” o fato de que multinacionais enriqueçam sozinhas enquanto a maioria da população cada vez mais sofre com a desigualdade política/econômica.

Referencias Bibliográficas:

BAUMAN, Zigmunt. O mal estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998

BOURDIEU, Pierre. Contrafogos 2: por Um Movimento Social Europeu. São Paulo: Zahar, 2009.

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos - o breve século XX. 10ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

GENTILI (org.), Pablo. Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o estado democrático. 4ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.

SENNETT, Richard. O Declínio do Homem Público: as tiranias da intimidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.