sábado, 29 de agosto de 2020

Os Direitos Políticos e a Organização dos Poderes na Constituição Federal de 1988

 

Os Direitos Políticos e a Organização dos Poderes na Constituição Federal de 1988


por Dennis de Oliveira Santos


 

            A atual Carta Magna brasileira, a Constituição de 1988, concretiza as bases jurídicas para a universalização da democracia no país e garante a todos os cidadãos o acesso a direitos básicos. Foi promulgada após décadas de regimes ditatoriais, instante em que direitos e liberdades individuais foram interrompidos. Dentre os seus diversos capítulos, os artigos 14, 15, 16, 17, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 56 vão estipular direitos políticos para a sociedade e definir a organização dos três poderes vigente em nossa estrutura política.


            No artigo 14, o qual versa sobre como deve ser a participação do cidadão na coisa pública, percebe-se que o sufrágio é o elemento fundamental para estruturar os direitos políticos para a sociedade. O voto é valorizado como a forma mais importante de participação política e do qual se originam outras experiências no espaço público. Ele é calcado na ideia de democracia representativa, noção que define a participação dos cidadãos de modo indireto, periódico, formal e se expressa por meio das instituições eleitorais e dos partidos políticos.


Ainda no mesmo dispositivo jurídico, três instrumentos de democracia direta são estipulados: o plebiscito, o referendo e a lei de iniciativa popular. A lei de iniciativa popular abre a oportunidade para a sociedade propor novas leis, algo que geralmente surge da vontade dos deputados e senadores. O referendo e o plebiscito são formas de consultas populares em que o povo também decide sobre assuntos públicos. Esses instrumentos de participação buscam ampliar a participação cidadã nos assuntos públicos e reduzir a distância entre representantes e representados.


Também é definido o alistamento eleitoral e o voto como obrigatórios a partir dos dezoito anos (facultativo para analfabetos, maiores de setenta e para quem tem entre 16 e 17 anos). Para o cidadão se candidatar a cargos políticos é necessário a filiação partidária, alistamento e domicílio eleitoral. Para se candidatar ao cargo de presidente, a idade mínima é de trinta e cinco, para governador trinta e vinte um para deputado federal, estadual, distrital ou prefeito. Já no artigo 15 há a preocupação em manter todos esses direitos. É descrito que só os perde perante os seguintes casos: incapacidade civil absoluta, cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado, condenação criminal e improbidade administrativa.


No artigo 17 é estabelecido o funcionamento das agremiações partidárias. Essas organizações devem ser de caráter nacional, não receberem recursos financeiros de governos estrangeiros e prestarem constas à Justiça Eleitoral. Assinalando o sistema multipartidário, a legislação esclarece que os partidos podem ser criados, extintos ou fundidos a qualquer momento da vida política do país e que possuem autonomia para definirem suas regras internas. Eles possuem personalidade jurídica através do registro no Tribunal Superior Eleitoral, recursos de fundo partidário e acesso gratuito ao radio e a televisão para propagarem suas propostas governamentais.


Adiante é definido que o Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Nessas casas do poder, cada legislatura terá a duração de quatro anos. Especificamente no Senado, cada Estado e o Distrito Federal elegem três senadores cada, com mandato de oito anos - sendo renovada de quatro em quatro anos. As deliberações de cada uma dessas instituições e de suas comissões serão tomadas por maioria dos votos, presentes a maioria absoluta dos seus membros.


Cabe ao Congresso Nacional decidir sobre vários temas, tais como: sistema tributário, fixação do efetivo das Forças Armadas, programas nacionais de desenvolvimento, limites do território nacional, moeda, telecomunicações, acordos internacionais, intervenção federal, julgar contas prestadas pelo Presidente, fiscalizar atos do Poder Executivo, entre outros.


De forma privativa a Câmara dos Deputados possui a responsabilidade de autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e proceder à tomada de suas contas, quando não apresentadas ao Congresso Nacional. Enquanto o Senado tem a responsabilidade de escolher chefes de missão diplomática, dispor sobre operações de crédito externo e interno da União, entre outros temas.


Por fim, nos artigos 53, 54 e 55 se é tratado sobre as características dos mandatos de deputados e senadores. Ambos os cargos são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões ou votos proferidos - só podem ser presos mediante um ato em flagrante de crime inafiançável. Além da imunidade parlamentar, os agentes do poder legislativo são proibidos durante o mandato de manterem relações econômicas com empresas públicas, acumularem mais de um cargo público eletivo e de exercerem funções dentro de repartições do Estado fora de suas atribuições.

 

 

 

 


A Necropolítica como Ferramenta de Controle na Politica Contemporânea

 


A Necropolítica como Ferramenta de Controle na Politica Contemporânea

 

por Dennis de Oliveira Santos

 

O filósofo camaronês chamado Achillle Mbembe traz à tona o conceito de necropolítica, um assunto muito em voga na ciência política para discutir as relações de poder estabelecidas entre sociedade e Estado no mundo contemporâneo. Através de um ensaio se alega que a dominação colonialista imposta pelos europeus nos países periféricos deixou como marca, traços de racismo e de políticas discriminatórias em geral por parte dos aparelhos estatais.


Ele utiliza como local para observação de suas teses a realidade do continente africano. Durante o século XIX e primeira metade do século XX, a dominação europeia na região era baseada numa rígida imposição da escravidão a população local, diferenciações sociais em que negros não tinham acesso a direitos básicos e uma pesada jornada de trabalho aos não europeus.


Esses fatores vão estruturar uma desigualdade social e um rígido controle social (que passa pelas instituições jurídicas), as quais vão permanecer nas nações mesmo já sendo independentes dos países europeus. Mesmo hoje as nações sendo democratas, independentes e não mais escravocratas, a consequência é a permanência de uma sociedade muito hierarquizada e que sofre todo tipo de violência e segregação no sistema capitalista de produção.


A formação dos Estados nacionais na periferia do capitalismo evidenciou um projeto de poder baseado nas marcas da colonização, a qual não emancipou a população de processos discriminatórios. Tradicionalmente a política trabalha com a ideia de universalizar os direitos a todos os seres humanos, ideia cara ao Ocidente, mas algo que não se vê de forma clara países na América Latina e na África que foram colônias das potencias europeias.


Dentro dessa lógica, o Estado desenvolveu formas repressivas de controle social. Essas práticas sustentam as hierarquias sociais e uma política de “segurança” que viola direitos básicos. Quer dizer, a partir do racismo que permanece no mundo atual, as autoridades públicas ditam em suas ações quem deve viver e quem deve morrer dentro da vivência política.


O Estado se pauta da letalidade para dizer qual cidadão deve permanecer vivo ou não – a necropolítica. Essa ação estatal se percebe em várias nações, mas ela se intensifica em países periféricos pelo fato da democracia nesses locais ainda sofrerem uma série de restrições.


O exercício da necropolítica, instante em que o Estado se estrutura em ações discriminatórias é o grande motor de guerras e conflitos atuais. Baseado na ideia de defesa nacional, por exemplo, o governo israelense massacra o povo palestino através de uma forte ação de extermínio. E dentro dessa situação nem se abre a possibilidade de ver o outro como portador de direitos básicos – apenas a ideia de que deve ser eliminado em nome da supremacia nacional e de controle territorial. Se desumaniza os povos palestinos, definem se eles devem morrer ou não para garantir acima de tudo a dominação política de Israel na questão da Palestina.


A necropolítica coloca as ações de extermínio e controle estatal acima dos direitos básicos e não considera o outro como um ser humano que deva ser minimamente respeitado. Sendo assim, o poder constituído no mundo ocidental é bastante assimétrico, instante em que o Direito deve ser profundamente rediscutido no sentido de relações sociais e políticas mais justas.


O racismo é o motor de princípio da necropolítica praticada pelos Estados. Isso pode ser percebido nas políticas de restrições da Europa em dificultar a chegada de imigrantes em seus territórios – leis cada vez mais severas e sistemas de vigilância marítimos que controlam constantemente os que chegam à região. No Brasil, durante o ano de 2016, segundo estatísticas oficiais, o número de homicídios foi de 65.517, sendo que os negros nessa numeração sofreram 2,5 vezes mais com a situação ao serem comparados com as pessoas não brancas. Exemplos sociais da necropolítica que tornam as relações humanas pautadas por ações discriminatórias.


Dessa forma, a necropolítica é uma importante ferramenta conceitual para entender a forma assimétrica e impositiva que os Estados nacionais agiram em situações como dizimação dos povos indígenas, o holocausto, o apartheid na África do Sul, o racismo no Brasil e etc. A meta governamental sendo assim é de impor medidas estratégicas de extermínio aos corpos considerados “desajustados” a ordem pública. Existe nessa lógica, a prática política em que pessoas “são descartáveis” ou não por parte do governo, mesmo que o Estado hoje institua leis e constituições que prezem pela universalização dos direitos humanos.


A política da morte opera de modo sistêmico e pontual segue os próprios valores e tem como definidor o critério raça. Tanto no período de colonizações europeias como em ambientes definidos formalmente pela democracia, populações têm suas liberdades suprimidas por parte das autoridades públicas. A necropolítica trabalha com o extermínio das pessoas e um rígido controle territorial, o qual pode determinar quem deve ser executado sem o menor constrangimento legal.