terça-feira, 2 de abril de 2013

Os Estereótipos do Negro na Literatura Brasileira do Século XIX




por Dennis de Oliveira Santos

No Brasil, as classes dominantes, desde os primórdios da colonização portuguesa, efetuam mecanismos que exploram a pauperização das classes subalternas em nome da expansão capitalista. Nesse contexto, apresenta-se uma questão ímpar acerca da identidade da população brasileira, a qual pode ser vista na representação literária sobre os negros (grupo étnico socialmente marginalizado): qual é a imagem do negro postulada na produção literária do século XIX e suas conseqüências sociais?
As imagens confeccionadas acerca da identidade negra nas obras literárias desta época eram construídas a partir dos interesses da elite brasileira. Elas consistiam num tendencioso racismo com a finalidade de forjar determinadas concepções a respeito do comportamento social dos negros - concepções que desenvolviam centras estereotipações acerca desta minoria étnica.  
·                          A primeira estereotipação nesse período nas produções literárias é encontrada no romantismo, na peça teatral O Demônio Familiar de José de Alencar. Nesta obra (ALENCAR, 2003), o literato cearense desenvolveu um racismo em seu molde mais primitivo, se assemelhando as posições de Hegel e Shakespeare. É importante detalhar, que em suas duas principais obras, que são os romances indianistas Iracema e O Guarani, o escritor nutrido por posições políticas anti-abolicionistas e visando criar uma literatura onde as personagens seriam provenientes das “raças que geraram este país”, o negro é excluído intencionalmente. Marginalizado do foco principal, onde apenas o índio e o português participam, é postulado a concepção do negro ruim. A inferioridade social seria intrínseca aos negros, estes, possuiriam comportamentos amorais e promiscuidades sexuais “sem freios”, o que testificaria uma crueldade nativa e uma feiúra rude, pois o negro seria ruim por natureza e sub-humano.
·                          No romance naturalista O Mulato de Aluísio Azevedo, se faz presente à concepção da má mistura entre as raças. O mulato seria uma degeneração racial por ser fruto da indevida relação social entre negros e brancos, idéia que ganhava mais adeptos com o apoio de teorias cientificistas como, por exemplo, o darwinismo social, que também condenava a mistura entre raças.
·                          Existe também a visão do embranquecimento, tendência muito presente na obra de Cruz e Sousa. Esta perspectiva tendia a “embranquecer” os negros e mulatos que pretendiam ter algum tipo de ascensão social, como são a própria obra e vida do escritor simbolista. A concepção funda-se na idéia de que para o negro ou mestiço ter ascendência social, ser reconhecido pelas classes cultas e economicamente ativas, precisava se adequar e internalizar os costumes provenientes da cultura desta camada social. O que teve como exemplo à obra do literato mestiço Cruz e Souza, que ao longo de toda a sua obra traça uma densa valorização a cor branca (BASTIDE, 1983).
A partir destas esteriotipaçoes acerca do negro no percurso histórico da formação ideológica emitida pela literatura temos por conseqüência social a marginalização dos negros na participação da formação cultural do país e o forjamento de imagens que retratam a organização social desta classe historicamente marginalizada.
A marginalização dos negros na participação cultural do país, que no século XIX tentavam suprimir suas crenças e outros tipos de manifestações, deixou para a posteridade um grande abismo no que condiz a exclusão social. O pensamento dominante das elites cultivou ao longo dos séculos a imagem ideológica do povo brasileiro como uma massa “pacífica” e “ordeira” frente às injustiças que sofrem (CHAUÍ, 1986). Os mais afortunados na pirâmide social brasileira tinham atitudes e formas de agir que espelhavam uma ideologia com viés racista; que além de marginalizar a participação social das camadas populares (a maioria de negros-escravos), criava uma imagem que distorcia as capacidades de reação por parte deste segmento populacional.
Sendo assim, a produção cultural oriunda dos letrados da época, era porta voz das categorias socialmente dominantes, tendendo a forjar uma ideologia que mascarava as contradições do sistema escravocrata e ignorava as reações populares frente ao ambiente social hostil a este segmento populacional (FERNANDES, 1978).
Detecta-se como a formação ideológica acerca desta etnia marginalizada, construída pelas elites europeizadas, ocultou as condições de vida e reação social destes marginalizados. Formação social que construiu para a posteridade, o mito da passividade do povo brasileiro, o que dificulta ainda mais a emancipação definitiva do país em termos de exclusão social.

Referências Bibliográficas:

ALENCAR, José de. O Demônio Familiar. São Paulo: Martin Claret, 2003.

BASTIDE, Roger. A Poesia Afro-brasileira. São Paulo: Perspectiva, 1983.

CHAUÍ, Marilena. Conformismo e Resistência: aspectos da cultura popular no Brasil. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1986.

FERNANDES, Florestan. A Integração do Negro na Sociedade de Classes (Volume 1). 3ed. São Paulo: Ática, 1978.




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