por Dennis de Oliveira Santos
No Brasil, as classes dominantes, desde os primórdios da colonização
portuguesa, efetuam mecanismos que exploram a pauperização das classes
subalternas em nome da expansão capitalista. Nesse contexto, apresenta-se uma
questão ímpar acerca da identidade da população brasileira, a qual pode ser
vista na representação literária sobre os negros (grupo étnico socialmente
marginalizado): qual é a imagem do negro postulada na
produção literária do século XIX e suas conseqüências sociais?
As imagens confeccionadas acerca da identidade
negra nas obras literárias desta época eram construídas a partir dos interesses
da elite brasileira. Elas consistiam num tendencioso racismo com a finalidade
de forjar determinadas concepções a respeito do comportamento social dos negros
- concepções que desenvolviam centras estereotipações acerca desta minoria
étnica.
·
A primeira
estereotipação nesse período nas produções literárias é encontrada no
romantismo, na peça teatral O Demônio
Familiar de José de Alencar. Nesta obra (ALENCAR, 2003), o literato
cearense desenvolveu um racismo em seu molde mais primitivo, se assemelhando as
posições de Hegel e Shakespeare. É importante detalhar, que em suas duas
principais obras, que são os romances indianistas Iracema e O Guarani, o
escritor nutrido por posições políticas anti-abolicionistas e visando criar uma
literatura onde as personagens seriam provenientes das “raças que geraram este
país”, o negro é excluído intencionalmente. Marginalizado do foco principal,
onde apenas o índio e o português participam, é postulado a concepção do negro
ruim. A inferioridade social seria intrínseca aos negros, estes, possuiriam
comportamentos amorais e promiscuidades sexuais “sem freios”, o que
testificaria uma crueldade nativa e uma feiúra rude, pois o negro seria ruim
por natureza e sub-humano.
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No romance naturalista
O Mulato de Aluísio Azevedo, se faz
presente à concepção da má mistura entre as raças. O mulato seria uma
degeneração racial por ser fruto da indevida relação social entre negros e
brancos, idéia que ganhava mais adeptos com o apoio de teorias cientificistas
como, por exemplo, o darwinismo social, que também condenava a mistura entre
raças.
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Existe também a visão
do embranquecimento, tendência muito presente na obra de Cruz e Sousa. Esta
perspectiva tendia a “embranquecer” os negros e mulatos que pretendiam ter
algum tipo de ascensão social, como são a própria obra e vida do escritor
simbolista. A concepção funda-se na idéia de que para o negro ou mestiço ter
ascendência social, ser reconhecido pelas classes cultas e economicamente
ativas, precisava se adequar e internalizar os costumes provenientes da cultura
desta camada social. O que teve como exemplo à obra do literato mestiço Cruz e
Souza, que ao longo de toda a sua obra traça uma densa valorização a cor branca
(BASTIDE, 1983).
A partir destas esteriotipaçoes acerca do negro
no percurso histórico da formação ideológica emitida pela literatura temos por
conseqüência social a marginalização dos negros na participação da formação
cultural do país e o forjamento de imagens que retratam a organização social
desta classe historicamente marginalizada.
A marginalização dos negros na participação cultural do país, que no
século XIX tentavam suprimir suas crenças e outros tipos de manifestações,
deixou para a posteridade um grande abismo no que condiz a exclusão social. O pensamento dominante das elites cultivou ao
longo dos séculos a imagem ideológica do povo brasileiro como uma massa
“pacífica” e “ordeira” frente às injustiças que sofrem (CHAUÍ, 1986). Os mais
afortunados na pirâmide social brasileira tinham atitudes e formas de agir que
espelhavam uma ideologia com viés racista; que além de marginalizar a
participação social das camadas populares (a maioria de negros-escravos),
criava uma imagem que distorcia as capacidades de reação por parte deste
segmento populacional.
Sendo assim, a produção cultural
oriunda dos letrados da época, era porta voz das categorias socialmente
dominantes, tendendo a forjar uma ideologia que mascarava as contradições do
sistema escravocrata e ignorava as reações populares frente ao ambiente social
hostil a este segmento populacional (FERNANDES, 1978).
Detecta-se como a formação ideológica
acerca desta etnia marginalizada, construída pelas elites europeizadas, ocultou
as condições de vida e reação social destes marginalizados. Formação social que
construiu para a posteridade, o mito da passividade do povo brasileiro, o que
dificulta ainda mais a emancipação definitiva do país em termos de exclusão
social.
Referências Bibliográficas:
ALENCAR, José de. O Demônio Familiar. São Paulo: Martin
Claret, 2003.
BASTIDE, Roger. A Poesia Afro-brasileira. São Paulo:
Perspectiva, 1983.
CHAUÍ, Marilena. Conformismo e Resistência: aspectos da
cultura popular no Brasil. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1986.
FERNANDES, Florestan. A Integração do Negro na Sociedade de
Classes (Volume 1). 3ed. São Paulo: Ática, 1978.
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