sexta-feira, 11 de março de 2011

O CINEMA COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO NO ENSINO DE SOCIOLOGIA

por Dennis de Oliveira Santos




Considerações Iniciais
Preocupar-se com o aprimoramento metodológico e com o aprofundamento de outras propostas pedagógicas deve ser a constante tarefa do educador rumo a finalidade de reciclar seus conhecimentos e no aperfeiçoamento de sua função pedagógica perante a sociedade. É nessa constante busca que o professor pode exercer de uma melhor forma
o seu papel na formação intelectual de seus alunos.

Nesse contexto, surge um relevante instrumento no auxílio pedagógico ao professor em suas aulas: o cinema. A “sétima arte” foi constantemente observada como um mero produto cultural. Porém, diante das possibilidades que ela apresenta quanto ao enfoque de filmes a conteúdos das disciplinas de Sociologia, ela torna-se um valioso instrumento pedagógico no aprofundamento dos assuntos discutidos em sala de aula. Desse modo, de que forma o cinema pode ser utilizado como instrumento pedagógico no ensino de Sociologia?

Procedimentos Metodológicos
Essa pesquisa foi produzida a partir de uma fundamentação metodológica baseada na Sociologia da Educação, que é a vertente da Sociologia que estuda a realidade socioeducacional, a qual oportuniza aos seus pesquisadores compreender que a educação se dá no contexto de uma sociedade que, por sua vez, é também resultante desse próprio processo educativo. Além disso, essa perspectiva também possibilita compreender e caracterizar a inter-relação ser humano/sociedade/educação à luz de diferentes teorias sociológicas (FERREIRA, 1993; MANNHEIM, 1974).
Nesse sentido, a Sociologia da Educação integrada a discussões teóricas de especialistas no âmbito da didática (DEWEY, 1966; FREIRE, 2007), constitui-se um cabedal metodológico-teórico que auxilie a discutir as concepções didáticas que propiciem o desenvolvimento da prática docente no que condiz aos procedimentos e posturas efetuadas por parte do educador. Além disso, foram utilizadas reflexões teóricas (TURNER, 1997; MODRO, 2006; DUARTE, 2002) de especialistas acerca do uso do cinema na prática educacional. Teorias educacionais e acerca do uso do cinema, as quais foram aplicadas a um estudo de caso. O local escolhido para aplicar essas experiências do uso do cinema em sala de aula pelo autor da pesquisa foi em sua disciplina de Introdução à Sociologia do curso Sociologia e Política da UNIFOR (UNIVERSIDADE DE FORTALEZA, 2007).

Concepções Didáticas
As concepções didáticas que podem ser relevantes para se efetivar uma reflexão acerca das práticas docentes anteriormente descritas são os métodos dos educadores Jonh Dewey e Paulo Freire. A partir do enfoque pedagógico que ambos atribuíram ao sentido da educação: a importância da experiência no ensino (Dewey) e a formação do espírito crítico na educação (Freire), situar de forma crítica alguns elementos de superação nas minhas práticas didáticas.

Dewey via a educação distintamente da forma tradicional. Para ele, o saber adquirido pelo aluno na escola poderia ser interligado em sua vida como cidadão. Quer dizer, a educação centra-se no desenvolvimento da capacidade de raciocínio e formulação do espírito crítico do educando ao invés de simples memorização das lições educacionais.
O educador norte-americano argumentava que enquanto alteramos nosso relacionamento com nosso ambiente sofremos alterações em decorrência dessas experiências. Isso equivale afirmar que o conhecimento é adquirido e expandido na medida em que nossas experiências passadas são utilizadas na elaboração de novos e significativos problemas. Nesse sentido, a educação é uma reconstrução da experiência, momento de aplicar experiências anteriores a situações novas.

Nesse contexto, a tarefa da escola é propiciar um ambiente no qual a aprendizagem se dê por vias de experimentos, de tal forma, que correspondam aos interesses dos alunos. Fazer que o aprendizado tenha significado para quem está sendo educado, que envolva-o ao mesmo tempo em que seja desafiado a novos questionamentos. Assim, o papel do educador é desenvolver no aluno a sua capacidade de interpretar a experiência, o que implica na construção de hipóteses que serão testadas por meio de novos experimentos - as experiências subseqüentes.

Desse modo, a educação consiste no enfoque do desenvolvimento de habilidades cognitivas ao invés da mera transmissão do conhecimento. Habilidades adquiridas que aumentarão a capacidade de raciocínio crítico do aluno, contribuindo para o desenvolvimento de sua autonomia. Vejamos o que o próprio autor comenta a respeito:

A educação é a reconstrução ou reorganização da experiência que acrescenta significado a esta e aumenta a habilidade para dirigir a experiência subsequente. (...) A função da escola não é transportar os adolescentes de um ambiente ativo para o outro de um estudo inerte dos registros daquilo que outros homens aprenderam, e sim levá-los de um ambiente de atividades selecionadas, tendo vista servir de guias para o aprendizado (DEWEY, 1966, p. 117-301).

Seu método didático de ensino caracteriza-se pelo “aprender fazendo”, que seleciona uma situação vivida pelo aluno, que seja desafiante e que careça de uma solução para um problema prático. Dessa forma, o professor deve expor os conteúdos escolares a partir de problemas ou questões, ao invés de antemão dá respostas ou soluções prontas em sala de aula.

Nesse contexto, Dewey propõe um procedimento fortemente amparado no método científico, em que existem cinco passos para resolução de problemas: primeiro, ter consciência do problema; segundo, defini-lo; terceiro, proposição de diversas hipóteses para solucioná-lo por parte dos alunos; quarto, examinar as conseqüências da cada hipótese a luz de experiências passadas; e quinto, testar a solução mais provável.

A junção desses cinco procedimentos substitui as definições ou conceitos elaborados apenas pelo professor. Deve-se fazer com que o aluno raciocine e elabore os próprios conceitos para depois confrontar com o conhecimento sistematizado. O ensino deve se basear na experiência do educando. Afirmações as quais são amparadas teoricamente pelo maior discípulo brasileiro do pensador norte-americano:

O conhecimento, pois, é o resultado de um processo de indagação. E a marcha deste processo de pesquisa é o que Dewey chama de lógica. Vale dizer: lógica é o processo do pensamento reflexivo; “conhecimento”, é o resultado deste processo; o “já conhecido” é o “material”, que usamos no operar a investigação ou pesquisa. (...) Para Dewey as próprias “formas” lógicas se originam de e no processo de indagação, inquérito ou investigação. Não pré-existem ao processo da indagação; mas, formam-se no e pelo processo mesmo da indagação, e são os instrumentos de direção e controle desse processo. (...) No complexo estágio humano, a deliberada formulação de problemas se transforma em um objeto de atividade em si mesma e, deste modo, a investigação em uma atividade permanente e, teoricamente, indefinida (TEIXEIRA, 04/04/2007, p. 04-13).

Para Paulo Freire a educação possui o papel transformador da realidade social dos educados, instante em que o ensino possui uma concepção crítica, capaz de atuar no desenvolvimento intelectual dos sujeitos e libertá-los rumo a condição de serem sujeitos da história ao invés de objetos.

Desse modo, o ensino, “a educação, como prática da liberdade, é um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade” (FREIRE, 06/04/2007, p. 1). Nesse sentido, é atribuído a educação a finalidade de possibilitar ao homem refletir sobre seu contexto sócio-histórico, abrindo espaço para sua conscientização e libertação das “amarras impostas” por suas relações sociais: ser o sujeito consciente de sua própria história. Fundamentação pedagógica exposta pelo autor:

É preciso que a educação esteja – em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos – adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história. (...) O homem não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da realidade, se não é auxiliado a tornar consciência da realidade e de sua própria capacidade de transformá-la (FREIRE, 06/04/2007, p. 16-17).

Baseado numa perspectiva dialética, o educador brasileiro estabelece seu método de ensino como forma de análise da situação concreta e existencial dos indivíduos. Seu movimento dialético exige que se passe do abstrato ao concreto, da parte ao todo, para voltar depois as partes; fazendo que o sujeito se reconheça no objeto como uma situação na qual se encontra com outras pessoas.

Há então a aplicação do método a partir de cinco fases: primeiro, a “descoberta do universo vocabular”, onde se levanta o universo vocabular do grupo que está sendo educado. É um momento em que ocorrem interações de aproximação e conhecimento mútuo (professor-aluno), para que o educador posteriormente se utilize da linguagem dos membros do grupo para tornar suas aulas inseridas na visão de mundo desses sujeitos.

O segundo passo é a seleção dessas palavras, a qual segue uma seqüência gradativa dos mais simples para os complexos, tudo inserido na realidade social dos educados. Já no terceiro momento há a criação de situações existenciais típicas do grupo com o qual se trabalha. Tratam-se de situações inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas para a análise crítica consciente de problemas locais dos sujeitos. No quarto momento se cria fichas-roteiro que nortearão/coordenarão os debates nas aulas. E na última fase se dá a criação de fichas “... nas quais aparecem as famílias fonéticas correspondentes as palavras geradoras” (FREIRE, 06/04/2007, p. 22).

O Cinema como Instrumento Pedagógico
Diante dessas fundamentações teóricas, as quais situam a tarefa do educador como valorização da experiência e a fomentação do espírito critico no aluno, o cinema surge como um instrumento a trabalhar tais aspectos na atividade educacional. Porém, de que forma deve ser utilizado o cinema em sala de aula?

O cinema utilizado de uma forma adequada e especificado de um modo claro quais os objetivos a serem alcançados com o filme, encontra-se então uma fonte inesgotável de significados para as pessoas em nossa cultura. Através desse instrumento é possível promover um acesso mais fácil a determinados assuntos concernentes a Sociologia. O que equivale afirmar que os filmes se prestam a inúmeras leituras e análises de acordo com o seu contexto (TURNER, 1997).

O material cinematográfico é uma relevante fonte de informações para se reconstruir através de imagens e sons uma dada realidade social. Tendo em vista que se deve propor um recorte de determinados aspectos a serem retratados, focando uma trama que faz parte de seu enredo histórico o conteúdo o qual leva os alunos a assistirem esse filme. Esses procedimentos por sua vez enriquecem as diferentes visões que cada aluno em sala de aula possa ter: acrescenta novas explicações sobre o tema em debate no filme, alerta para novos detalhes a serem captados, ilustra questões da realidade social da temática em discussão, etc (DUARTE, 2002).
Porém, alguns cuidados na utilização dos filmes devem ser levados em conta. O docente deve-se atentar para o fato de que o vídeo pode e deve ser utilizado como suporte as suas aulas, mas de forma racional, estipulando critérios e nunca utilizando o material cinematográfico como substituto das aulas. Dessa forma, o cinema é tido como um recurso auxiliar, o qual complementa o que é ministrado aos educados. Nesse sentido, deve-se atentar para a escolha do filme:

Um dos maiores problemas na escolha de um filme é diretamente relacionado à censura do mesmo. Por vezes alguma cena que contenha nudez, violência, palavras de baixo calão e coisas do gênero podem gerar transtornos significativos caso não haja um trabalho adequado de preparo em relação ao filme. (...) Assim, é necessário, sempre, assistir anteriormente ao filme, selecionar o que será trabalhado, e, previamente alertar e preparar o público para o que será assistido (MODRO, 2006, p. 12).

A questão acerca da veracidade das obras cinematográficas é outro assunto que deve ser refletido por parte do docente. Sempre deverá ser ressaltado ao público que os filmes são apenas uma representação do real, momento em que a realidade social é transposta para a arte a partir de determinados pontos de vista; sendo uma representação parcial do real. Ou seja, o cinema é uma fonte de conhecimento representativa, para a partir daí ser analisado o conteúdo de seu bojo. Os filmes nunca devem ser considerados como representantes fidedignos dos eventos que retratam.
Deve-se também adequar o filme a proposta desejada pelo professor, instante em que haverá a exposição de quais objetivos são desejados e como se espera alcança-los. Além disso, o educador estará atento na escolha dos filmes, principalmente a temas polêmicos que possam gerar controvérsias em relação a valores morais ou religiosos. Discuti-los não equivale a defender um ponto de vista específico, mas expor diferentes formas de pensar (DUARTE, 2002).

Procedimentos pedagógicos que possuem como objetivo trabalhar o cinema de forma coerente e adequado a temas específicos, sempre voltados para a apresentação ou complementação de conteúdos ministrados pelo professor. Utilizando os filmes de forma delimitada, ou seja, interligando o conteúdo cinematográfico com as temáticas da disciplina, alcança-se importantes resultados rumo a horizontalização das discussões dos assuntos abordados em sala de aula.
Procedendo dessa forma, cada filme apresentará múltiplas possibilidades junto à criatividade e habilidade do educador em conduzir o processo. Tornando o uso do cinema uma experiência riquíssima aos alunos, principalmente quando se considera as possibilidades de se estabelecer uma relação do conteúdo do filme com temas das disciplinas ministradas pelo professor.

Considerações Finais
A partir das reflexões teóricas discutidas e das observações em estudo de caso, percebe-se que o cinema é um eficaz instrumento pedagógico no ensino de conteúdos concernentes a ciência sociológica. Utilizar filmes como recurso auxiliar é uma relevante forma de enriquecer a aula, cabendo ao professor definir qual o melhor caminho para que seus objetivos sejam alcançados plenamente.

Constata-se que o uso do vídeo pode ser uma constante na prática docente desde que se atente para alguns cuidados e se estabeleça de forma objetiva quais as finalidades programáticas de ensino que serão alcançadas com esse tipo de atividade junto aos alunos. Trabalhando com esse recurso em sala de aula, suscita por parte do professor a possibilidade de aguçar um maior olhar crítico dos alunos em relação aos temas presentes nos filmes. O cinema surge assim como uma reconstrução da realidade histórica, tornando-se um importante instrumento na contextualização dos assuntos em pauta em sala de aula.

Referências Bibliográficas

DEWEY, John. Democracy and Education. Nova York: Macmillan, 1966.

DUARTE, Rosália. Cinema & Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

FERREIRA, Roberto Martins. Sociologia da Educação. São Paulo: Moderna, 1993

FREIRE, Paulo. Alfabetização e Conscientização. Disponível em: . Acesso em: 6 de Abril de 2007.

MANNHEIM, Karl. Introdução a Sociologia da Educação. 3ed. São Paulo: Cultrix, 1974.

MODRO, Nielson Ribeiro. Cineducação 2: usando o cinema na sala de aula. Joinville: Univille, 2006.

TEIXEIRA, Anísio. Bases da Teoria Lógica de Dewey. Disponível em . Acesso em: 4 de Abril de 2007.

TURNER, Graeme. Cinema como Prática Social. São Paulo: Summus, 1997.

UNIVERSIDADE DE FORTALEZA. Curso de Sociologia e Política. Disponível em: . Acesso em: 08 de Abril de 2007.

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