sexta-feira, 11 de março de 2011

Problemas Ambientais do Rio Cocó

por Dennis de Oliveira Santos



Considerações Iniciais
O Rio Cocó é o principal recurso hídrico de Fortaleza. Possui sua nascente na Serra de Aratanha e tem uma extensão de 45 Km. Ele é afluente do Rio Ceará e se estende por diversas áreas urbanas da cidade, encontrando-se, por fim, com o mar, na praia Caça e Pesca. Possui cerca de 30 afluentes, 16 açudes e 36 lagoas. Em seu baixo curso cerca de 16 Km a montante de sua foz observa-se um exuberante manguezal, ocupando uma área equivalente a 402 hectares, e sua bacia corresponde a 2/3 da área do município de Fortaleza (PARQUE VIVO, 2003).

Sem dúvida, este rico ecossistema, onde a vida se manifesta por todos os lados, possuidor de uma extensa fauna e flora, de rico solo, deve ser um tema de constante discussão por parte da população fortalezense e seus governantes. Seja por sua relevância ambiental, o Rio Cocó sempre deve ser objeto de preservação e aproveitamento equilibrado de seus recursos. Diante este contexto, projeta-se a seguinte indagação: qual a postura do Estado na preservação dos recursos hídricos do rio Cocó?

Procedimentos Metodológicos
Essa pesquisa foi desenvolvida a partir de uma perspectiva baseada na Sociologia Urbana (SOUZA, 2003), na qual se utilizou os seguintes procedimentos metodológicos: a primeira etapa foi à coleta de dados e estudo de textos elaborados por teóricos do planejamento urbano. Em seguida foi coletado material sobre os projetos da administração pública. E a seguir, os projetos estatais entorno do tema foram analisados e contextualizados com a Constituição Federal (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1989) e o conjunto de leis jurídicas do Direito Ambiental (MACHADO, 2004).

As Ações Governamentais
Através de uma observação empírica sobre a atual situação do Rio Cocó, percebe-se que devastadores ações da sociedade vem ocasionando problemas ambientais para este recurso hídrico. Diante deste contexto de desintegridade ambiental e descaso com as questões ecológicas, o que se tem sido discutido e feito no âmbito da administração pública? Para elucidar essas indagações, adota-se como base os documentos oficiais do poder público sobre a questão ecológica. Para isso, analisa-se as leis provindas do Direito Ambiental, procurando verificar se esse instrumento legal é cumprido pelo Estado, e de que forma.

Vale lembrar que o Direito Ambiental é um ramo jurídico público que se ocupa dos princípios e normas destinados a impedir a degradação dos elementos da natureza, objetivando assegurar à população uma melhor qualidade de vida. Ele é o conjunto de técnicas, regras e instrumentos legais organicamente estruturados para assegurar um comportamento que não atente contra a sanidade do meio ambiente, o que permite o uso racional e sustentado dos recursos naturais (EUFRÁSIO, 2000).

O Direito Ambiental alia o Estado aos especialistas no sentido da elaboração de projetos das ações governamentais sobre as questões do meio ambiente. Porém, o que se observa em quesito de ações públicas em torno do Rio Cocó são ações produzidas de uma ineficácia de projetos e não cumprimento das leis vigentes. O licenciamento ambiental, por exemplo, prescrito na resolução Conama, nº 237, estabelece que compete ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da lei nº 6938, de empreendimentos e atividades com significado impacto ambiental de âmbito nacional ou regional.

Essa regulamentação jurídica é cumprida pelo Estado? A reposta é não. O maior exemplo dessa negligência estatal iniciou-se em Dezembro de 2002, quando a Prefeitura de Fortaleza prontificou-se a construção de uma ponte sobre a foz do Rio Cocó. O principal objetivo dessa obra, de acordo com a Prefeitura Municipal, seria a interligação da Praia do Futuro com a Praia de Sabiaguaba, dando assim acesso direto às praias do litoral leste de Fortaleza. No entanto, esse projeto, embora aprovado pelo IBAMA, não teve o seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) analisados pelo Conselho Municipal do Meio Ambiente (CONAM), tão pouco pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (MEIO AMBIENTE, 2004).
Nesse contexto, técnicos e moradores do entorno da Praia do Futuro não tiveram a possibilidade de discutir e analisar o projeto antes do início de sua execução. O que fere uma lei da Constituição Federal, que afirma que compete aos poderes legislativos e executivos municipal, no processo de elaboração e na fiscalização de implementação do plano diretor, garantir a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas de vários segmentos da comunidade (PINTO, 2004).

Em resposta ao problema, a SEMACE, em seu informativo mensal, publicou reportagens de audiências públicas sobre questões que não são tão urgentes e essenciais como o caso da poluição do Rio Cocó. O texto enfatiza que a Agenda 21 foi discutida na cidade de Bela Cruz com a presença do Poder Público e da sociedade local. Em outro trecho, argumenta que visa-se sensibilizar e incentivar a implantação da Agenda 21 no município (AMBIENTE DO CEARÁ, 2003). Porém, o que se sabe é que após essa audiência nada mais foi executado.

Como foi dito anteriormente, diversos detritos industriais são jogados no Rio Cocó, como é o caso de seu afluente, a Lagoa do Porangabussu, infligindo, portanto, a Legislação Federal do Conselho Nacional do Meio Ambiente, que na resolução Conama, nº 001, artigo 5, afirma que se deve definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual de localiza. Ato que também contraria a lei estadual nº 13.103 da política estadual de resíduos sólidos, a qual, de acordo com o Inventário de Resíduos Sólidos Industriais, determina ser o gerador responsável pelo resíduo, desde a sua geração até o destino final (AMBIENTE DO CEARÁ, 2004).

Diante dessas ações devastadoras para o desequilíbrio ambiental do Rio Cocó, o setor industrial é punido por tais atos? Mais uma vez a administração pública se ausenta face aos devidos cumprimentos jurídicos, ferindo outra resolução, a Conama, nº 007, artigo 38, que enfatiza que os Estados, territórios e o Distrito Federal, através dos respectivos órgãos de controle ambiental, deverão exercer sua atividade orientadora, fiscalizadora e punitiva das atividades potencialmente poluidoras instaladas em seu território, ainda que os corpos de água prejudicados não sejam de seu domínio ou jurisdição.

Quanto à ineficácia nas aplicações dessas leis, diante de um governo que visa atender apenas uma parte da população com os elementos necessários de saneamento básico, vale destacar outra infração dos procedimentos jurídicos, que afirma, no 2ª artigo da Constituição Federal, o seguinte: a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes sociais – garantia do direito à cidade sustentável, entendido como direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental (PINTO, 2004).

Como resultante desse contexto de ineficácia das leis referentes às questões ambientais, o atual sistema de drenagem no Rio Cocó tem grande parte de seus cursos de água poluídos por diversas canalizações. Isto tudo se agrava devido à topografia plana da cidade, que apresenta grandes dificuldades de escoamento das águas. Problema que é percebido no período das chuvas, quando enchentes são freqüentes nos locais mais urbanizados da cidade.

Vale também ressaltar que Fortaleza apresenta graves problemas ambientais a respeito do tratamento de seu lixo. Depositado em locais como beiras de avenidas, áreas de moradia, terrenos vazios e, principalmente, próximos aos recursos hídricos, os resíduos sólidos poluem os solos através dos processos de infiltração. Além disso, o escoamento superficial de impurezas tende a provocar o assoreamento e a contaminação dos cursos de água.

A questão do que fazer com o lixo produzido é um sério problema ambiental. Não existe na prática a coleta diferenciada, visto que, o município recicla ao mês 1% dos 31 possíveis para o lixo urbano (AMBIENTE DO CEARÁ, 2003). Para agravar ainda mais tal situação, a Ecofor ainda adota uma política de beneficiamento na coleta de lixo apenas para os bairros de elite da cidade. Fato comprovado em seu Calendário da Coleta Domiciliar, que diz que na Aldeota a coleta é feita duas vezes ao dia enquanto em bairros periféricos é feito apenas uma vez ao dia, como é o caso da Aerolânida (ECOFOR, 2004).

Ao final, detecta-se inúmeros erros de planejamento urbano, má execução das leis jurídicas e limitadas discussões sobre o tema por parte da administração pública. Fica a concepção de que o meio ambiente no município de Fortaleza padece mais por inaplicação das leis especificas ao invés da suposta inexistência das mesmas. São sintomas de uma administração pública baseada num planejamento urbano meramente técnico.

Considerações Finais
Percebe-se que as ações provindas da administração pública são decorrentes de inúmeros erros de planejamento urbano, má execução das leis jurídicas e limitadas discussões sobre o tema por parte desta instituição. Existe uma certa consistência e concretização de dados coletados e analisados por documentos como o Inventário Ambiental e do Inventário de Resíduos Sólidos Industriais, que auxiliam na execução do Plano Diretor. Porém, o Rio Cocó é marginalizado de projetos e ações que inibem a sua degradação ambiental, o que já é concretizado em outras regiões do estado do Ceará. O que também é bem observado diante da ausência no cumprimento das leis já vigentes, sendo que nenhuma lei foi criada em específico para as principais áreas urbanas por onde passa o rio. Enfim, vê-se um contexto de incapacidade pública, que é um elemento crucial para que o mais importante recurso hídrico de Fortaleza se torne cada dia mais desintegrado ambientalmente.


Referências Bibliográficas

ECOFOR. Calendário da Coleta Domiciliar. Fortaleza: ECOFOR, 2004.

EUFRÁSIO, Carlos. Direito Ambiental. Fortaleza: UNIFOR, 2000.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 12ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

MEIO AMBIENTE DO CEARÁ (IBAMA), Instituto Brasileiro do. Educação no Processo de Gestão Ambiental. Fortaleza: IBAMA, 2004.

MEIO AMBIENTE DO CEARÁ, Superintendência Estadual do. Informativo Mensal da SEMACE. Fortaleza: SEMACE, 2003a.

______. Inventário de Resíduos Sólidos Industriais. Fortaleza: SEMACE, 2004.

______. Plano de Gerenciamento das Bacias Metropolitanas. Fortaleza: SEMACE, 2003.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1989.

PARQUE VIVO, Projeto. O Manguezal do Rio Cocó e o Parque Adahil Barreto. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará (UFC), 2003.

PINTO, Antônio Luiz de Toledo (org.). Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2004.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Abc do Desenvolvimento Urbano. Rio de Janeiro: Bertrand, 2003.

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